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11/11/2019

Livre, Leve e Solto

Agora, essa!

Algum peão tocador de berrante soprou que "Lula está solto, mas não está livre" e essa praga se espalhou mais que carrapato em meio ao gado, mais contagiosa que o mal da vaca louca, que compromete o cérebro dos animais.

O desapreço que essa gente tem por um simples dicionário é inacreditável. Bastava folhear um, e eu juro que não é difícil procurar palavras pela ordem alfabética. É uma questão de hábito.

Lula está livre, sim. Livre, leve e solto!

Ele está tão livre quanto eu e você, que acreditou nessa patacoada.

Sabe por quê? Porque ele, eu e você somos inocentes, não somos culpados de nada, porque não há sentença condenatória transitada em julgado contra nenhum nós (bom, falo por mim e por Lula, pois, quanto a você, nada sei sobre sua folha corrida; quanto a mim, nem sentença, nem processo algum há).

Se você me perguntar se hoje ele está "livre para ser candidato", eu sou obrigado a reconhecer que não, por força de uma interpretação anômala que o TSE deu à Constituição Federal, mas isso é outra coisa. Estar "livre para" é diferente de estar em pleno gozo da liberdade de ir e vir.

Se você é casado e se considera plenamente "livre", eu lhe pergunto: você está "livre para" casar? Não, neste momento não, a menos que queira cometer bigamia. Você está "livre para", sozinho, vender integralmente um imóvel que seja de sua propriedade e de seu cônjuge? Não, porque a lei o impede, como impede Lula de ser candidato. Mas nem você, nem ele podem deixar de ser qualificados como "livres".

Você, como eu, como Lula, está livre para ir ao Nordeste, à Argentina, ao Japão e até à lua, se tiver como ir. Livre para ir e livre para voltar.

Antes de sair por aí repetindo o que lhe vem pelo berrante errante, vá ler um dicionário, primeiro. Depois, leia a Constituição e, se não for exigir muito de você, leia na sequência um singelo livrinho de Direito.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 11/11/2019)

10/11/2019

Polidez e Persuasão

Talvez eu seja ingênuo, mas ainda acredito na civilização. Por isso opto, sempre que possível, pela polidez no relacionamento com as pessoas.

Nessa atmosfera de ódio que nos cerca, muitas pessoas a quem acreditávamos conhecer se revelaram radicalmente diferentes do que nos pareciam.

O princípio desse fenômeno perdeu-se no retrovisor e é muito simplista identificá-lo com o advento das redes sociais, embora estas o tenham amplificado, mas o fato é que se desencadeou, ao longo do tempo e de maneira pouco perceptível, um movimento multitudinário que encorajou as pessoas a extravasarem seus instintos primitivos, pré-civilizatórios, pré-históricos. Agigantou-se assim o ódio ao outro. Passou-se a ver o que pensa diferente como um inimigo a ser descartado, excluído do grupo, se possível aniquilado.

A seguir nesse ritmo, o que se avizinha são combates sangrentos, não a guerra tradicional de uma nação contra outra, mas enfrentamentos mortais entre nacionais, entre concidadãos, entre pessoas que habitam sob um mesmo teto. É o fascismo em sua roupagem de gala.

Porém, assim como a Humanidade, ao longo da História, evoluiu da barbárie à civilização - e evoluiu especialmente pelo desenvolvimento da Política (pólis; polidez) e do Direito -, eu ainda acredito numa breve regeneração desses raivosos e odientos contemporâneos.

Penso que o que nos cabe fazer, como seres amantes da Humanidade e de seus avanços civilizatórios, é resgatar a principal característica da Política desde que os gregos a inventaram: a persuasão. E a única forma de persuadir as pessoas é por meio das palavras, apelando à racionalidade, o que exige tratamento civilizado nos diálogos.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 10/11/2019)