15/06/2021

Maior e Vacinado

A experiência da vacina contra a Covid 19 foi de fato muito emocionante. É a vida encontrando seu caminho, como disse o personagem vivido por Jeff Goldblum em "Jurassic Park" (aquele mesmo de "A Mosca"). Fui hoje a um local de Jacareí, onde resido durante a semana, chamado Educa Mais, ao lado da rodoviária. É um espaço de arquitetura arrojada destinado, até onde pude observar, a teatro e eventos artísticos e culturais. Coisa de prefeito petista, imagino.

Lá chegando, apresentei meu comprovante de endereço e um documento de identificação e o sujeito da recepção fez meu cadastro. Ditei meu CPF em blocos de três dígitos e terminei com o "um" e o "três" finais dizendo "treze, confirma". E sublinhei: "que é o mais importante". O sujeito riu e eu já me senti em casa.

Faço isso já há tempos, sempre que os caixas de estabelecimentos comerciais me perguntam se quero a nota fiscal paulista. Nunca perco a oportunidade. Até um ano atrás, as reações eram de desconforto, irritação ou impassividade. De então para cá, porém, as expressões de contentamento estão cada vez mais intensas. Como dizia Ulysses Guimarães, repetindo um milhão de outros políticos e pensadores, a política é como nuvem, se transforma a cada instante.

Da recepção fui à sala de aplicação da vacina. Lá havia uma mesa grande com quatro ou cinco servidores sentados lado a lado, como mesários nos locais de votação em dias de eleição, assim dispostos para, mais uma vez, conferir documentos e, finalmente, preparar a injeção e o certificado. Vício é mesmo uma coisa invencível. Adivinhe se não perguntei "onde está a urna eletrônica". Claro. Mais risos.

Antes de a enfermeira espetar a agulha no braço, outra colega com cara de chefe da equipe fez a mim e ao outro candidato a jacaré - as pessoas eram atendidas duas a duas - uma breve palestra sobre a astrazêneca e suas possíveis reações, reforçando os cuidados.

Esclareceu que aquela vacina era produzida pela Fiocruz e eu fiquei preocupado com as coisas que a capitã Cloroquina falou na CPI sobre a tara fálica do pessoal do instituto carioca. Eu preferia que fosse do Butantã, até pela vantagem de me transformar em cobra, em vez de jacaré. Mas, estando em Jacareí, não tinha como. Pensei até se em Capivari, minha cidade de origem e onde resido com ânimo definitivo, eu não poderia me transformar em capivara, um animal, digamos, mais família. Ponderei que era tarde demais para certas exigências, sobretudo um capricho bairrista.

A primeira enfermeira mostrou o pequeno frasco com a dose de meio mililitro de um líquido transparente, a seringa, a agulha, e eu perguntei se eles não ministravam uma anestesia antes, pois detesto imaginar certas coisas enfiadas em meu corpo - inda mais sendo um produto da Fiocruz. Ela disse que a aplicação de um anestésico levaria tempo maior e seria mais dolorido. Aceitei calado e desviei os olhos. Detesto.

Mal senti a picada, mas confesso que me veio uma vontade de chorar. De emoção sincera. Contive o choro, porém, por conta do receio de acharem que fosse de medo ou dor, ou de parecer o menino que nos anos sessenta abria o berreiro ao tomar as injeções que me aplicavam as freiras do Círculo Operário de Rafard nas minhas primeiras crises de bronquite.

Fechei a camisa, levantei-me, disse com alguma timidez o infaltável "viva o SUS", cumprimentei a todos e saí. Ainda tomado pela mesma emoção, fiz a selfie exibindo o cartão de vacinação e postei, claro, no Facebook. Afinal, tradição é tradição, mesmo que recém-inaugurada.

Agora, sim. Maior e vacinado.

Maior, no caso, pelo tamanho. Difícil está sendo me adaptar à reação que a zelosa enfermeira-chefe esqueceu-se de mencionar. Vou lhes dizer, é complicado controlar o rabo. Já derrubei duas mesinhas e os vasos que estavam sobre elas, afora o notebook de um colega de trabalho, até agora o prejuízo mais vultoso. Mas vou me acostumar, tenho fé.

As garras que cresceram no lugar das unhas, já antes carentes de um corte profundo, até que são úteis. Serviram, por exemplo, para espantar dois engraçadinhos que vieram me cobrar uns trocos que lhes tomei emprestado dia desses. Um deles não volta mais. Engoli a seco. Prometi a mim mesmo que vou comprar desses molhos prontos e andar com eles no bolso por aí, balsâmico, italiano, tradicional. Barbecue, de preferência. Um jacaré nunca sabe a hora em que vai ter almoço para se servir.

A pele dura e enrugada também tem tido sua utilidade neste dia de muito frio, mas não quero passar a ser conhecido como um sujeito casca grossa. A boca é que me parece estar crescendo um tanto devagar. Até agora só deu para sentir o gostinho de ser como o cacique Raoni. Espero que o crescimento seja uniforme e os dentes não fiquem muito expostos. Prefiro o sorriso cínico do lagarto ao escárnio escancarado dos crocodilianos.

Planos para o futuro. 7 de setembro, adeus feriado prolongado em Capivari. Estarei a postos em Jacareí para a segunda dose. Independência, afinal! Ou morte. Quinze dias depois, agendar o cabeleireiro, que esta juba não combina com jacaré e eu não quero ser confundido com a personagem cabeluda do Sítio do Picapau Amarelo.

Ainda em setembro, pretendo ir lá para a região central do país. Não, não vou me mudar para o Pantanal, não. Prefiro continuar vivendo em meu habitat natural, entre capivaras, jacarés e a gente boa daqui de São José dos Campos, onde trabalho.

Eu me refiro a Brasília. Será um passeio gastronômico. Um bate-e-volta, apenas para degustar um prato para lá de especial: um perigoso "serial killer" (pronuncia-se "siri ao quilo", ou melhor, "siri ao quíler") que já matou mais de quinhentas mil pessoas, um sujeito gorduroso que anda rondando a capital federal e que se diz incomível. Quero ver se é mesmo.

Sei que sofrerei intoxicação alimentar, terei diarréia, mas certas reações são inevitáveis. Digo já de cátedra.

Você não perde por me esperar, genocida!

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, aos 15 de junho de 2021, no intervalo do almoço).

13/06/2021

Treta de Domingo

Fim de semana é legal porque dá pra gente tretar com bolsomínions, cada vez mais desorientados.

Esta foi agora há pouco, num grupo de Americana, onde morei por sete anos e mantive escritório e trabalhei até agosto de 2018.

A provocação está nas imagens. Minha resposta:

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"Leandro Tri, como 'Lula não conseguiu manter o que ele fez de bom', se ele fez um segundo mandato ainda melhor que o primeiro?

Por que você acha que ele teve avaliação tão elevada ao fim do segundo mandato, a ponto de eleger sua sucessora, e ainda a reelegeu quatro anos depois?

O 'decaiu' é elucubração sua. É como chifre: coisa que colocaram na sua cabeça.

O dólar foi 'equiparado ao real' apenas no lançamento do plano Real. E você não come em dólar, mas em real. E você não come PIB, mas aquilo que seu salário lhe proporciona comprar. Faça as contas e veja quanto valeram, em dólar, os salários mínimos durante os governos FHC, Lula, Dilma, Temer e hoje. E veja em que período do real nossa moeda valeu mais e o salário mínimo teve maior poder de compra.

Dilma fez um excelente governo no primeiro mandato e, a partir do início do segundo, passou a ser sabotada pelo inconformismo de Aécio Neves, que não aceitou a derrota, e pelo espírito vingativo de Eduardo Cunha, que transformava toda iniciativa do governo para corrigir os rumos da economia em "pautas bomba", que só pioravam a situação.

Você precisa conhecer melhor as coisas sobre as quais opina. Você não cita, mas está se referindo à lei Rouanet. Pergunto a você: o que é a Lei Rouanet? Você sabe desde quando ela existe? Você sabe dizer quando foi que BolsoNero revogou a Lei Rouanet?

Respondo: a lei Rouanet é uma lei de incentivo às atividades artísticas. Empresas financiam artistas e espetáculos e obtêm abatimentos no imposto de renda. Existe desde 1991 e foi assinada pelo então presidente Fernando Collor de Mello (aquele que foi tirado do poder por corrupção e hoje é conselheiro pessoal de Jaera Genocias BolsoNero) e pelo ministro Jarbas Passarinho, remanescente dos governos militares. E está em vigor até hoje - ou seja, seu Micto sequer tentou revogá-la.

Quanto aos "estádios versus hospitais", sinto informar-lhe, mas o governo federal não construiu nenhum estádio. O BNDES, sim, emprestou dinheiro para a iniciativa privada (empresas) para que esta os construísse - e esse empréstimos vêm sendo regularmente pagos (lembra o desfecho da tal "caixa Preta" do BNDES que tanto berrou BolsoNero? Pois é...).

O BNDES existe para isso mesmo: para incentivar os investimentos privados.

Por esse seu raciocínio, tudo o que foi financiado pelo BNDES é obra do governo federal. Ou seja, todos os hospitais privados, todas as escolas privadas, todas as fábricas, os estabelecimentos industriais e comerciais, todos os equipamentos agrícolas e da indústria construídos ou adquiridos por financiamentos do BNDES durante os governos do PT são obras dos governos petistas. É isso mesmo?

Então, vivas ao PT!!!

13 de junho de 2021