02/09/2021

Metralhas no Planalto

Meio século levei para aprender como se chamam personagens que marcaram minha infância. Desde meus sete anos leio e curto os Irmãos Metralhas e nunca desconfiei que eles tivessem nomes. Acabo de ver na Wikipedia: Bruto, Briguento e Burguer, na versão brasileira. Em Portugal, eles são Chico Esperto, Pula e Hambúrguer.

Três irmãos malvados e desastrados, por vezes patéticos, conhecidos por números. Lembram a prole de um certo presidente de uma república bananeira ao sul do Equador que chama os filhos de Zero Um, Zero Dois e Zero Três. Como os Metralhas, são três, mas por vezes aparecem quatro, cinco...

Todos têm em comum o dezessete no início dos números que os identificam: 176-671, 176-761 e 176-176.

Na página da Wikipedia, os “Beagle Boys” (no original inglês) são catalogados como da espécie “cachorro”, ocupação “ladrões” e característica “atrapalhados”. Têm por amigos o Mancha Negra, o Bafo-de-Onça e o Lobão - enfim, a milícia toda. Pense em Hélio Negão, Fabrício Queiroz... O Lobão já se retirou da turma. Lágrimas no escuro.

Bruto é o Zero Um. Não é Chico, mas é Esperto, como na versão lusitana. Tão esperto que se elegeu senador depois de tornar-se famoso por defecar nas calças e desmaiar durante um debate para prefeito do Rio de Janeiro.

O mais briguento é o Briguento, a quem o pai chama de Zero Dois. Suas maiores façanhas consistem em fazer ataques enigmáticos pelo Twitter que obrigam adversários a ocupar a semana tentando decifrar o que ele quis dizer. Briguento gosta mesmo é de quebrar o pau. Acuado, abre seu vistoso rabo de pavão – um luxo! - e pula nos braços de um misterioso primo. Pula!

O Zero Três é o Burguer. É tão bom em fritar hambúrgueres que o pai quis nomeá-lo embaixador nos Estados Unidos. A intenção era servir as delícias pessoalmente ao amado presidente do país do norte, mas, apeado Trump do poder, não rolou a mesma química com Biden. Notem que em Portugal esse Metralha atende pelo nome de... Hambúrguer! No Brasil, tornou-se conhecido pela falta de outras qualidades, como a que lhe rendeu o apelido de Dudu Bananinha.

A Wikipedia menciona outros parentes dos Metralhas, como o Primo Azarado, cuja numeração é 1313, vejam só! De coincidências também se vive. Carl Barks, criador dos personagens, certamente já antevia a presença de certo índio na familícia que passou a vida ocupada em roubar a Caixa-Forte de Patópolis.

Nos próximos cinquenta anos que me restam ainda vou descobrir que o pai de todos eles chama-se Jair Bafo-de-Onça.

(LUÍS ANTÔNIO ALBIERO, em Jacareí, SP, aos 2 de setembro de 2021)

29/08/2021

Nano, o Megaempresário

Nanoval é empresário. Convidado para ser sócio de uma empresa, assim se tornou. Ainda é pequeno, mas enxerga-se mega e sonha ver seu nome na lista de bilionários da Forbes.

Nano, como o chamam no clube dos falsos amigos, é exemplo da meritocracia dos bons relacionamentos.

Seu hobbie é cuidar de orquídeas, mas a planta a que dedica maior atenção é uma florzinha que cultiva no coração. Nano tem ódio de pobre.

Odeia seus empregados, suas domésticas e até mesmo seus gerentes e diretores que não se reconhecem como pobres, em cujos corações também viceja a venenosa flor do ódio.

Odeia particularmente Lula, a quem vê como representante do pobre que o próprio Nano foi um dia. Detesta sobretudo o filho dele, embora não faça a mínima ideia de quantos rebentos Lula tem, onde vivem, como vivem, de que se alimentam. Nano odeia Lulinha porque ficou milionário limpando cocô de elefante no zoológico e acabou sócio da Friboi. “Catando coco”, como escreve Nano, incapaz de compreender a importância da acentuação gráfica.

Apesar do sucesso conquistado à base de falcatrua, sonegação fiscal e apropriação da mais-valia, Nano continua um nanico cognitivo. Não duvido que ele creia que a Friboi venda carne de elefante vitaminada com o esterco do zoológico.

Nano inveja o sucesso de Lulinha porque este é dono do casarão da ESALQ, do iate do dono da rede TV! e de uma Ferrari folheada a ouro que deixa sob os cuidados de um xeique árabe que vive na Espanha – afora o fazendão que vai do Oiapoque ao Chuí.

Não duvidem, Nanoval é homem de muita fé, do tipo que faz questão de propagandear cada ato de caridade que pratica.

Certo dia, Jesus em pessoa passou diante de sua mansão. Nano viu-o multiplicar peixes e pães, distribui-los aos famintos, dar água aos sedentos, esperança aos desesperados e vida em abundância a milhões antes condenados a morrer de inanição ou viver na exclusão social. Mas as singelas vestes de Jesus denunciavam sua opção preferencial pelos pobres e Nanoval estremeceu. Chamou a polícia e Jesus foi preso.

Dias depois passou na mesma rua o diabo em carne, osso, rabo e chifres. Nanoval o viu pela janela da cozinha. Trajava roupas da cor do fogo, portava um tridente e um caprichado cavanhaque e fazia arminha com as mãos. Dizia coisas com as quais Nano se identificava, tanto que passou a chamá-lo de mito e o elegeu presidente.

Nanoval está radiante com o mito e até desistiu de produzir feijão. Resolveu investir em fuzis. O nanomegaempresário está certo de que agora chega à lista da Forbes.

(LUÍS ANTÔNIO ALBIERO, em Capivari, SP, aos 29 de agosto de 2021)