Eu não devia tê-los colocado diante do espelho da sua própria consciência.
Não era meu direito ter confrontado sua fé cristã, que creio sincera, com as ideias de quem defendia torturar, metralhar e matar e que hoje exorta o país a comemorar o assassínio de Estado cometido pelo regime militar iniciado em 1º de abril de 1964 – uma onda de violência e mortandade em massa contra estudantes, trabalhadores, políticos, intelectuais, religiosos, até mesmo crianças, tudo em nome do velho combate a alguma coisa até hoje jamais vista no Brasil que atende pelo nome de “comunismo”. Fico aqui imaginando seu Jesus aplaudindo e abençoando aquele espetáculo de horrores.
Não podia eu ter tantas vezes enfatizado que as juras de patriotismo de seu candidato eram endereçadas, na verdade, à bandeira do “grande irmão do norte”, à qual ele prestava continência, orgulhoso, e a quem hoje, obsequioso, entrega nosso solo, nossas riquezas e nossa gente.
Não devia ter chamado sua atenção para o risco que corria a Democracia acaso fosse eleito um sujeito limítrofe – o perfeito idiota – que só pensava e segue pensando em armar, em duplo sentido: colocar armas nas mãos do povo e passar o dia armando confusões sempre que abre a boca ou manipula os teclados, pelo Twitter, hoje transformado em sede de governo. O agronegócio, os caminhoneiros, os produtores de leite e o Mourão que o digam.
Eu não tinha o direito de os amedrontar com a possibilidade, ainda presente, de chorarmos sobre caixões de jovens, filhos nossos ou de amigos, parentes, conhecidos, brasileiros em geral, na volta de uma tresloucada guerra contra um país vizinho e irmão, apenas para servir de linha auxiliar dos Estados Unidos no roubo do petróleo venezuelano.
E por que tinha eu que destacar que o seu preferido agia como um covarde, sempre fugindo do debate direto, e vazio, pois não apresentava proposta alguma para combater o desemprego, a fome e os principais problemas enfrentados pela Nação? Sequer se ouviu dele um discurso, uma frase ao menos, em favor da pacificação do país – ele que dizia, e era tudo o que dizia, que seu governo daria ênfase à segurança pública, traduzido pelo incrível Sérgio Moro e seu “pacote anticristo” em conceder licença a agentes do Estado para matar ainda mais pobres e jovens negros da periferia.
Não me esqueço da amiga querida de infância, por quem nutri muito mais do que admiração, que me aconselhava a usar o que me havia "restado de neurônios" e dizia que eu fazia “joguinho de cinismo” que não a convencia e que eu devia acordar, pois, afinal, Lula estava preso e em breve Haddad também estaria. Sim, hoje vejo o quanto eu a incomodava com questionamentos, que ela me respondia dizendo que nem lia o que eu lhe escrevia, ao mesmo tempo em que me chamava de “esquerdopata” e perguntava como teriam feito “lavagem cerebral” em mim. Eu esperava contraargumentos, ela me vinha com memes e informações que adquiria no mercado gratuito das verdades prontas, como uma certa "República de Curitiba", página virtual hoje banida por produzir "fake news" com dinheiro público.
Não, não era meu direito desafiar a sua reconhecida inteligência cartesiana e a ela peço desculpas também por isso. Nada obstante, eu me reservo o direito de ainda insistir em acreditar que a terra não é plana, que Hitler e seus seguidores nunca foram de esquerda, que em 1964 houve um golpe sangrento no Brasil, que Pinochet, Stroessner e Ustra não são heróis, mas bandidos, que Olavo de Carvalho é astrólogo e não filósofo, que quem quebrou o país foram os golpistas corruptos de 2016 e não o PT, que Lula é preso político enquanto os corruptos seguem livres, que a Universidade e a educação devem ser para todos e que Jesus jamais foi visto em pés de goiaba.
Minha amiga querida, meus estimados amigos, parentes, colegas e conhecidos, hoje reconheço. Eu não devia ter provocado que vocês expusessem suas próprias almas. Que coisa horrível!
Perdoem-me.
(Luís Antônio Albiero, em 31 de março de 2019)