23/11/2019

Vácuo Preenchido

Lula passou 580 dias preso na masmorra política de Curitiba e nesse extenso lapso temporal - um ano e meio! - não despontou nenhuma alma brasileira com disposição e legitimidade para liderar a oposição a BolsoNero.

Cá entre nós petistas, nem Fernando Haddad conseguiu se firmar nessa posição, como esperávamos, muito menos Ciro Gomes, que passou esse tempo todo tentando, isso sim, consagrar-se como líder antipetista e fazendo acenos e constrangedores afagos ao governo BolsoNero.

Foi Lula sair da prisão política para sua liderança aflorar natural e imediatamente. Nem a mídia elitista, que durante todo o período de confinamento condenou o ex-presidente ao ostracismo, está conseguindo ignorar o grande comandante da oposição que ressurgiu com sangue nos olhos.

E ressurgiu colocando os pingos nos is sobre a lenga-lenga da "autocrítica do PT" e reconhecendo a polarização como necessária no processo político.

Candidato ou não, Lula está em campo nesse jogo histórico entre a civilização, representada por ele e por todos aqueles que reconhecem a Política como atividade humana necessária para a paz social e a Democracia como seu melhor regime, e, no polo oposto, a barbárie representada por BolsoNero, seu clã, seu multifacetário ministério e seu amplo suporte miliciano - compreendendo as milícias propriamente ditas, armadas e sediadas no Rio de Janeiro, e as virtuais, que incluem robôs e uma rede de odientos que se prestam ao papel de massa de manobra do bolsonarismo.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 23 de novembro de 2019)

11/11/2019

Livre, Leve e Solto

Agora, essa!

Algum peão tocador de berrante soprou que "Lula está solto, mas não está livre" e essa praga se espalhou mais que carrapato em meio ao gado, mais contagiosa que o mal da vaca louca, que compromete o cérebro dos animais.

O desapreço que essa gente tem por um simples dicionário é inacreditável. Bastava folhear um, e eu juro que não é difícil procurar palavras pela ordem alfabética. É uma questão de hábito.

Lula está livre, sim. Livre, leve e solto!

Ele está tão livre quanto eu e você, que acreditou nessa patacoada.

Sabe por quê? Porque ele, eu e você somos inocentes, não somos culpados de nada, porque não há sentença condenatória transitada em julgado contra nenhum nós (bom, falo por mim e por Lula, pois, quanto a você, nada sei sobre sua folha corrida; quanto a mim, nem sentença, nem processo algum há).

Se você me perguntar se hoje ele está "livre para ser candidato", eu sou obrigado a reconhecer que não, por força de uma interpretação anômala que o TSE deu à Constituição Federal, mas isso é outra coisa. Estar "livre para" é diferente de estar em pleno gozo da liberdade de ir e vir.

Se você é casado e se considera plenamente "livre", eu lhe pergunto: você está "livre para" casar? Não, neste momento não, a menos que queira cometer bigamia. Você está "livre para", sozinho, vender integralmente um imóvel que seja de sua propriedade e de seu cônjuge? Não, porque a lei o impede, como impede Lula de ser candidato. Mas nem você, nem ele podem deixar de ser qualificados como "livres".

Você, como eu, como Lula, está livre para ir ao Nordeste, à Argentina, ao Japão e até à lua, se tiver como ir. Livre para ir e livre para voltar.

Antes de sair por aí repetindo o que lhe vem pelo berrante errante, vá ler um dicionário, primeiro. Depois, leia a Constituição e, se não for exigir muito de você, leia na sequência um singelo livrinho de Direito.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 11/11/2019)

10/11/2019

Polidez e Persuasão

Talvez eu seja ingênuo, mas ainda acredito na civilização. Por isso opto, sempre que possível, pela polidez no relacionamento com as pessoas.

Nessa atmosfera de ódio que nos cerca, muitas pessoas a quem acreditávamos conhecer se revelaram radicalmente diferentes do que nos pareciam.

O princípio desse fenômeno perdeu-se no retrovisor e é muito simplista identificá-lo com o advento das redes sociais, embora estas o tenham amplificado, mas o fato é que se desencadeou, ao longo do tempo e de maneira pouco perceptível, um movimento multitudinário que encorajou as pessoas a extravasarem seus instintos primitivos, pré-civilizatórios, pré-históricos. Agigantou-se assim o ódio ao outro. Passou-se a ver o que pensa diferente como um inimigo a ser descartado, excluído do grupo, se possível aniquilado.

A seguir nesse ritmo, o que se avizinha são combates sangrentos, não a guerra tradicional de uma nação contra outra, mas enfrentamentos mortais entre nacionais, entre concidadãos, entre pessoas que habitam sob um mesmo teto. É o fascismo em sua roupagem de gala.

Porém, assim como a Humanidade, ao longo da História, evoluiu da barbárie à civilização - e evoluiu especialmente pelo desenvolvimento da Política (pólis; polidez) e do Direito -, eu ainda acredito numa breve regeneração desses raivosos e odientos contemporâneos.

Penso que o que nos cabe fazer, como seres amantes da Humanidade e de seus avanços civilizatórios, é resgatar a principal característica da Política desde que os gregos a inventaram: a persuasão. E a única forma de persuadir as pessoas é por meio das palavras, apelando à racionalidade, o que exige tratamento civilizado nos diálogos.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 10/11/2019)

09/11/2019

Analfabetismo Social

Essa história do "Lula analfabeto" só revela o analfabetismo social das pessoas que assim o consideram.

Vou confessar uma coisa. Eu li muito em minha vida - de anúncio de jornal a densos romances de Dostoiévski -, mas estou com inveja de Lula, que nesses 580 dias já deve ter lido mais do que eu em toda a minha vida!

Por exemplo, ainda não consegui ler Mia Couto, escritor moçambicano, ou o cubano Leonardo Padura, que Lula já leu!

E leu mesmo, conforme testemunhou, no que lhe diz respeito, o escritor Lira Neto, com quem Lula discutiu passagens da biografia de Getúlio Vargas, de sua autoria.

Durante o discurso de hoje, no sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, ele fez referência a ter feito um curso de economia. Não, não é faculdade de economia, mas um curso que lhe foi ministrado por economistas do mais alto calibre, como Maria da Conceição Tavares, Aluísio Mercadante, Luciano Coutinho e outros.

Antes de se tornar presidente, ele aprendeu muito com grandes intelectuais brasileiros, como Francisco Weffort, Florestan Fernandes, Márcio Pocchmam e tantos outros.

Lula não é fruto do acaso, não. Lula é fruto de seu próprio esforço e dos que o auxiliaram nessa caminhada, há muito tempo vitoriosa.

Eu tenho pena dessas pessoas que, cegas pelo preconceito, perturbadas pelo ódio, não sabem apreciar o momento raro e o privilégio irrepetível de poder conviver, ao vivo, em cores, de carne e osso, com alguém que pelos séculos e séculos amém será considerado uma pessoa mítica.

(Luís Antônio Albiero, 9/11/2019, em São José dos Campos)

O Espetáculo de Lula

Moro quis humilhar Lula ao prendê-lo, em abril de 2018, mas o ex-presidente soube dar as cartas e comandou o espetáculo da sua própria prisão, para a qual caminhou altivo levando consigo o imenso carinho do povo que, em vigília no sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, tentava de todo modo impedir o infortúnio.

Agora - desta vez Dallagnol e seus comparsas da OrCrim da Lava Jato -, quiseram novamente humilhá-lo, tentando forçá-lo a deixar a prisão para passar para o regime semiaberto, carregando uma culpa que Lula sabe que não tem.

Lula recusou a "oferta", teve a paciência de esperar e, mais uma vez, gerenciou o espetáculo da sua libertação. De novo, nos braços do povo e retornando ao mesmo sindicato de São Bernardo.

É por isso que tantos o temem.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 9/11/2019)

21/10/2019

No Japão

Brasileiro caminhando pelas ruas de Tokyo pergunta a uma adolescente japonesa:

- Oi! Você sabe quem sou eu?

Ela:

- Hmmmmm... Não!

Ele:

- Vou lhe dar um dica!

Ela:

- Arrã...

Ele:

- Sou presidente do Brasil, talquei!

Ela:

- Lula!?! Mas você tirou aquela barba charmosa?!?

07/09/2019

Pelo Voto e Sobre a Lei

Vivemos uma ditadura que se implementou pelo voto popular e vai se sustentando sobre a letra fria da lei.

O presidente do TJ do Rio de Janeiro anulou a liminar de um juiz que suspendia a decisão arbitrária do prefeito Marcelo Crivella que determinava a apreensão de livros com "conteúdo impróprio", expostos na Bienal do Livro.

A decisão do desembargador baseou-se no estatuto da criança e do adolescente (ECA), que em dado artigo prevê que “as revistas e publicações destinadas ao público infantojuvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família”.

O que não falta por este Brasil adentro são publicações com ilustrações de "armas e munições", por exemplo, a começar de jogos de "vídeo game", filmes na TV e discursos do presidente da república, mas com isso ninguém se importa. O que importa é que não haja beijo gay.

É interessante constatar que o beijo gay escandaliza, mas o beijo hétero, esse não. E o estatuto (ECA) não diferencia um do outro.

Noves fora, o que escandaliza é a homossexualidade, um problema que reside exclusivamente no departamento do preconceito que cada um guarda dentro de si, uns com mais zelo do que outros.

Ocorre que o ECA também não faz menção à homossexualidade.

Então, onde está o erro jurídico do desembargador presidente do TJ/RJ?

Está na compreensão do que sejam "valores éticos e sociais da pessoa e da família".

Ele simplesmente desconhece - porque seu compartimento de preconceito o impede de ver - que haja pessoas e famílias com características diferenciadas da pessoa e da família dele próprio.

O erro, portanto, não está no estatuto, na lei, mas na consciência equivocada e na visão retrógrada dos que têm o dever de aplicá-la e de fazê-la cumprir.

(Luís Antônio Albiero, de Capivari-SP, em 7 de setembro de 2019)

20/06/2019

O CPCu do Marreco

Doutor Frank me pediu que fosse ao gabinete do doutor Helene buscar o CPP, por empréstimo. Era o início dos anos 80 e não havia computadores, tablets, celulares. A fonte do Direito vinha mesmo em volumes pesados de papel e capa dura que reuniam leis, comentários, jurisprudência. Lá fui eu à sala do juiz da segunda vara criminal de Piracicaba buscar a fonte do direito processual penal para o outro magistrado, da primeira, de quem eu era escrevente de audiências.

Doutor Helene, hoje desembargador (imagino que aposentado), tinha fama de ser rude com os serventuários, o que me deixou com maus pressentimentos. Adentrei à sala, estavam apenas ele e Rosângela, a escrevente. Ele ditava qualquer coisa à minha colega e eu aguardei em pé, à porta. Quando terminou, ele, com ar grave adequado à fama, atirou em minha direção seus tremebundos olhões enormes, sob os quais cultivava fartos fios de bigode, tudo adornado por uma vasta cabeleira e vistosas correntes e pulseiras. Anunciei, com voz claudicante: “vim buscar o CPP, a pedido do doutor Frank”. Ele então esticou-se todo na cadeira, bufou, cerrou o cenho e me perguntou: “o que é CPP?”

Partindo tal pergunta de um juiz, eu só poderia concluir que ele estava brincando comigo. “Código de Processo Penal”, respondi candidamente, mas com uma nesga de preocupação. E ele: “quanta intimidade o senhor tem com o código, hein! CPP é para os íntimos!” O juiz malvado, no fundo, era mesmo um brincalhão. Ri, agradeci e saí.

As leis no Brasil, especialmente os códigos, são conhecidas assim, por apelidos. CF é a Constituição Federal; CLT é a Consolidação das Leis do Trabalho; ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente. A antiga LICC – lei de introdução ao Código Civil – agora é LINDB – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – à qual chamo, na intimidade, de “Lindbergh”. De fato, as siglas proporcionam uma certa aproximação íntima com o objeto.

As leis federais, sabemos, têm valor nacional, ou seja, valem por todo o território brasileiro, podendo alcançar até mesmo, conforme o caso e a pessoa, espaços no estrangeiro, como navios e aeronaves. Mas há uma gleba no Brasil em que as leis federais e a própria Constituição parecem não valer. Refiro-me a Curitiba.

Ali desenvolveu-se um ramo próprio do Direito, em que é normal um juiz conversar com procuradores da República para traçar estratégias de atuação dos acusadores contra determinado réu. Não vou mencionar o nome de um réu em especial, para não passar a impressão de que o direito curitibano tenha por destinatário uma única pessoa, nem insinuar que naquela próspera comuna paranaense não se respeite o princípio da impessoalidade.

Lá na zona franca de Curitiba a lei permite, por exemplo, condução coercitiva ainda que o conduzido sequer tenha sido previamente intimado a depor. Lá é possível que um juiz intercepte (ops!) uma ligação telefônica entre uma presidenta da República e seu colega ex-presidente. Lá é normal que o mesmo juiz encaminhe a conversa não ao Supremo Tribunal Federal – que, ao que parece, abriu mão de sua jurisdição sobre as plagas curitibanas –, mas à Rede Globo de Televisão.

Estou me referindo ao Código Penal de Curitiba, que, para não confundir com o nosso bom e rejuvenescido Código de Processo Civil (CPC), resolvi apelidar de CPCu. Na intimidade, por óbvias razões abjetas, eu pronuncio "cepecu".

De acordo com o CP-Cu, é absolutamente normal que o juiz estabeleça contato com um procurador por meio de um aplicativo de rede social e, pedindo sigilo, passe-lhe orientações sobre como uma de suas colegas deva se comportar em audiência. Aliás, até mesmo que esse procurador recomende ao chefe do bando – ops! –, digo, da força-tarefa, que a moça não esteja presente quando o réu, aquele determinado a quem não me referi, for ouvido em depoimento.

Como escrevente do saudoso doutor Frank, falecido no cargo de desembargador, muitas vezes presenciei seus diálogos com promotores e advogados. Nunca o vi sugerir a uns ou outros como devessem agir em determinados casos. Quando alguém se metia a pedir isto ou aquilo em relação a um processo, o juiz nascido em Itapetininga, onde houvera exercido dois mandatos de vereador antes de ingressar na magistratura, dizia-lhes simplesmente: “peticione, que eu respondo nos autos”.

Já o jurista natural de Maringá, cujo notório saber figadal concebeu o CP-Cu, abandonou a magistratura, assumiu seu lado político e hoje responde pelo Ministério da Justiça do Brasil. Chegou a tentar emplacar parte de sua genuína obra em todo o país, por meio das tais “dez medidas”, formalmente propostas por seus dallagnoizinhos a quem servia de “coach”, mas hoje parece renegá-la em parte. Cito como exemplo aquela parte em que a “orcrim” (adoro siglas) dos malandros federais tentava tornar normal em todo o Brasil, como já era prática corrente na capital paranaense, a utilização de prova obtida por meio ilícito – se bem que, por aquelas bandas, por vezes ocorre de prova alguma ser necessária.

O marreco autor do CP-Cu agora deu de grasnar que os diálogos por ele travados na escuridão das redes sociais com os procuradores, trazidos à luz pelo site The Intercept Brasil, foram obtidos por meios ilícitos e que, por isso, esse tipo de expediente não tem valor legal. Ou seja, ele acabou de reformular seu CP-Cu, de modo que sensacionalismo e vazamento já não são mais normais.

(Luís Antônio Albiero, 55, procurador municipal e ex-vereador de Capivari-SP pelo Partido dos Trabalhadores)

16/06/2019

A Prática da Conspiração

Na prática, a teoria é outra. De fato, descobrimos que por vezes é mais grave do que pode supor o mais sábio dos homens.

As revelações até agora feitas pelos jornalistas do site “The Intercept Brasil”, comandados pelo premiado Glenn Greenwald, mostram a sordidez inimaginável do conluio da operação Lava Jato.

Enquanto toda a colusão sobrevivia nas sombras, sempre alertamos para a evidência de que desde a origem a Lava Jato estava viciada, porque, ao pretexto de combater a corrupção, dedicava especial disposição de perseguir e punir integrantes do Partido dos Trabalhadores. Sabíamos que, cedo ou tarde, a verdade viria à tona, mas não podíamos supor a profundidade e o alcance das investidas da organização criminosa que se instalou em Curitiba com seus integrantes trajados de super-heróis. Tudo o que dizíamos nesse sentido era logo desqualificado: “ah, teoria da conspiração! Você acredita em Papai Noel!” Pois é. A teoria revelou-se procedente e foi muito além das suposições.

As revelações ainda são mínimas, mas bombásticas e bastantes até aqui para uma reflexão acerca do alcance devastador do conciliábulo que, desde o início, esteve sujeito ao movimento dos dedos (metafórica e literalmente) de um juiz de primeira instância lotado numa capital provinciana deste país continental.

Não foi apenas uma perseguição a um cidadão nominado Luís Inácio na pia batismal, nem somente a um líder político de dimensão mundial alcunhado Lula. A conspirata corroeu todas as instituições do país. Um juiz de piso e meia dúzia de deslumbrados meninos de faces róseas e pendores messiânicos puseram abaixo a República. Da mídia ao Supremo, não restou pedra sobre pedra. O que ainda se mantém em pé são escombros que cairão à primeira lufada.

Das mãos – e dedos – de Sérgio Moro e seu bando saíram petardos que detonaram a indústria da construção civil brasileira que começava a conquistar o mundo, a indústria naval que se reerguia, partes importantes da Petrobras – empresa à qual juravam estar defendendo – e, a seu reboque, veio abaixo um estado inteiro como o Rio de Janeiro. Milhões de empregos foram dizimados, a economia brasileira foi para o espaço e o pré-sal, esperança nacional, foi bovinamente entregue a estatais (leia-se nações) estrangeiras.

A Farsa-Jato envenenou a população contra um governo que, apesar dos problemas, ostentava altos índices de aprovação. Em parceria com a mídia velha, conseguiu convencer importantes segmentos da sociedade de que o comando do país estava tomado por corruptos, o que, entre aspas, “legitimou” a derrubada da presidenta, ainda que não houvesse um crime de responsabilidade, e em seguida a condenação e prisão da liderança política com maior viabilidade de vencer as eleições seguintes. Exterminou todas as demais lideranças e partidos de centro-direita e pavimentou a avenida que levou à eleição do parvo fascista que hoje nos governa. Tudo isso é sabido, não representa novidade, ao menos para quem enxergava os fatos políticos com um mínimo de sensatez e inteligência.

Mas a Farsa-Jato é responsável por muito mais. Seus métodos ilegais foram o tempo todo justificados por órgãos superiores do sistema judiciário porque era importante “combater a corrupção”. O TRF-4, julgando certa conduta de Sérgio Moro, concluiu que “situações excepcionais exigem soluções excepcionais”. De todos os desembargadores que compõem o tribunal, apenas um – um! – votou em sentido contrário. Todos os demais desconsideraram o art. 5º da Constituição Federal que garante a todo cidadão brasileiro que “não haverá tribunal de exceção”. Significa que o cumprimento da lei não admite o tratamento excepcional dado pelos magistrados gaúchos. A lei é a lei e, como tal, deve ser respeitada, e ponto. Ninguém está acima dela, muito menos o juiz, que tem por dever funcional observá-la e fazer com que seja cumprida.

O raciocínio tortuoso dos desembargadores gaúchos não só foi tolerado pela Suprema Corte como assimilado por muitos de seus ministros, inclusive pelo Conselho Nacional de Justiça, que detinha competência para reprimir as diatribes e conter a desenvoltura com que, a céu aberto, agia Sérgio Moro, cujo resultado foi a derruição do estado democrático de direito.

E eis que vêm a lume suas ações criminosas cometidas nos recônditos esgotos das redes sociais.Expostas ao sol, vemos Moro e seus comparsas responsáveis pela terra arrasada que se tornou o Brasil. Tínhamos convicção disso, agora temos provas.

Thank You, Glenn. Congratulations.

(Luís Antônio Albiero, Capivari-SP, 15 de junho de 2019)

31/03/2019

Pedido de Perdão

Dirijo-me aos amigos e amigas com quem travei duros debates por ocasião das eleições do ano passado. Faço-lhes este sincero pedido de perdão.

Eu não devia tê-los colocado diante do espelho da sua própria consciência.

Não era meu direito ter confrontado sua fé cristã, que creio sincera, com as ideias de quem defendia torturar, metralhar e matar e que hoje exorta o país a comemorar o assassínio de Estado cometido pelo regime militar iniciado em 1º de abril de 1964 – uma onda de violência e mortandade em massa contra estudantes, trabalhadores, políticos, intelectuais, religiosos, até mesmo crianças, tudo em nome do velho combate a alguma coisa até hoje jamais vista no Brasil que atende pelo nome de “comunismo”. Fico aqui imaginando seu Jesus aplaudindo e abençoando aquele espetáculo de horrores.

Não podia eu ter tantas vezes enfatizado que as juras de patriotismo de seu candidato eram endereçadas, na verdade, à bandeira do “grande irmão do norte”, à qual ele prestava continência, orgulhoso, e a quem hoje, obsequioso, entrega nosso solo, nossas riquezas e nossa gente.

Não devia ter chamado sua atenção para o risco que corria a Democracia acaso fosse eleito um sujeito limítrofe – o perfeito idiota – que só pensava e segue pensando em armar, em duplo sentido: colocar armas nas mãos do povo e passar o dia armando confusões sempre que abre a boca ou manipula os teclados, pelo Twitter, hoje transformado em sede de governo. O agronegócio, os caminhoneiros, os produtores de leite e o Mourão que o digam.

Eu não tinha o direito de os amedrontar com a possibilidade, ainda presente, de chorarmos sobre caixões de jovens, filhos nossos ou de amigos, parentes, conhecidos, brasileiros em geral, na volta de uma tresloucada guerra contra um país vizinho e irmão, apenas para servir de linha auxiliar dos Estados Unidos no roubo do petróleo venezuelano.

E por que tinha eu que destacar que o seu preferido agia como um covarde, sempre fugindo do debate direto, e vazio, pois não apresentava proposta alguma para combater o desemprego, a fome e os principais problemas enfrentados pela Nação? Sequer se ouviu dele um discurso, uma frase ao menos, em favor da pacificação do país – ele que dizia, e era tudo o que dizia, que seu governo daria ênfase à segurança pública, traduzido pelo incrível Sérgio Moro e seu “pacote anticristo” em conceder licença a agentes do Estado para matar ainda mais pobres e jovens negros da periferia.

Não me esqueço da amiga querida de infância, por quem nutri muito mais do que admiração, que me aconselhava a usar o que me havia "restado de neurônios" e dizia que eu fazia “joguinho de cinismo” que não a convencia e que eu devia acordar, pois, afinal, Lula estava preso e em breve Haddad também estaria. Sim, hoje vejo o quanto eu a incomodava com questionamentos, que ela me respondia dizendo que nem lia o que eu lhe escrevia, ao mesmo tempo em que me chamava de “esquerdopata” e perguntava como teriam feito “lavagem cerebral” em mim. Eu esperava contraargumentos, ela me vinha com memes e informações que adquiria no mercado gratuito das verdades prontas, como uma certa "República de Curitiba", página virtual hoje banida por produzir "fake news" com dinheiro público.

Não, não era meu direito desafiar a sua reconhecida inteligência cartesiana e a ela peço desculpas também por isso. Nada obstante, eu me reservo o direito de ainda insistir em acreditar que a terra não é plana, que Hitler e seus seguidores nunca foram de esquerda, que em 1964 houve um golpe sangrento no Brasil, que Pinochet, Stroessner e Ustra não são heróis, mas bandidos, que Olavo de Carvalho é astrólogo e não filósofo, que quem quebrou o país foram os golpistas corruptos de 2016 e não o PT, que Lula é preso político enquanto os corruptos seguem livres, que a Universidade e a educação devem ser para todos e que Jesus jamais foi visto em pés de goiaba.

Minha amiga querida, meus estimados amigos, parentes, colegas e conhecidos, hoje reconheço. Eu não devia ter provocado que vocês expusessem suas próprias almas. Que coisa horrível!

Perdoem-me.

(Luís Antônio Albiero, em 31 de março de 2019)

16/02/2019

Os Monstros da Lagoa

(Uma sugestão para Fernando Haddad)

Duas coisas precisam ser compreendidas e destacadas:

1. Lula não sairá da prisão apenas porque há ou haverá povo nas ruas.

2. Lula só deixará o cárcere se um grupo invadir a sede da Polícia Federal e o retirar de lá à força para imediatamente conduzi-lo ao exterior (ou a alguma embaixada ideologicamente alinhada) ou se um ou alguns ministros do Supremo (ou do STJ) lhe concederem a liberdade, seja absolvendo-o, seja reconhecendo a prescrição (vale dizer, reduzindo as penas aos patamares legais, artificial e injuridicamente elevados pelo TRF-4), seja deferindo um pedido de habeas corpus.

Nem um, nem dez, nem cem milhões de pessoas nas ruas gritando por Lula Livre comoverão um ou mais ministros do STF a libertá-lo.

A mobilização popular é fundamental, não se nega, pois pode criar um clima positivo, favorável à libertação de Lula, mas sem que um ou alguns ministros aponham suas assinaturas numa ordem concessiva da liberdade ao ex-presidente qualquer iniciativa nesse sentido será inócua e frustrante.

Em suma, as duas frentes de batalha são imprescindíveis. Não é possível focar numa e negligenciar na outra.

Por isso, penso que, a par das ruas cheias, seja necessária uma mobilização de peso no âmbito do Judiciário.

Para que qualquer juiz de esquina possa expedir uma ordem libertando Lula não faltam elementos, motivos jurídicos há a cântaros, mas é fato que o caso está na mais elevada Corte do país e todos os operadores do Direito sabem que um tribunal só concede habeas corpus contra uma decisão judicial se nela for detectada uma teratologia.

Teratologia vem do grego (τερατολογία, composto de τερατο- «monstro» e -λογία «estudo») e significa estudo do que é monstruoso, ramo da medicina que se dedica a compreender as malformações e deformidades dos seres humanos. Numa palavra, significa monstruosidade.

Uma decisão judicial teratológica, monstruosa, é aquela em que a nulidade salta aos olhos, de tão flagrante.

No célebre julgamento em que a ministra Rosa Weber acedeu à maioria precedente de um colegiado reduzido e abriu mão de inaugurar uma maioria no plenário, para negar um habeas corpus a Lula, o ministro Luiz Fux chegou a mencionar que não via, no caso, nenhuma teratologia.

Teratologia, porém, é o que não falta na sentença do tríplex do Guarujá, verdade que se aplica também à nova condenação imposta pela juíza "hard heart".

Teratológica é a decisão que condena um réu qualquer por corrupção passiva sem que indique um único ato de ofício que servisse de contraprestação à "propina" recebida.

Monstruosa é a sentença que, à míngua desse ato de ofício, condena o réu por conta de "atos de ofício indeterminados".

Aberrante é a decisão que condena o acusado porque alguém lhe "atribuiu" uma propriedade qualquer.

Monstruosa é o veredito que não enquadra a conduta do réu em nenhum dos três verbos do tipo penal da corrupção, que são "solicitar", "receber" ou "aceitar (promessa)", e ainda assim o condena.

Teratológica é a decisão que, não tendo havido a transferência da propriedade, nem mesmo da posse (sequer as chaves do apartamento foram entregues a Lula ou a algum de seus parentes ou assessores), do imóvel ao réu, condena-o por uma figura inexistente no Direito brasileiro, a tal "propriedade de fato".

Monstruosa é a sentença que condena com base exclusivamente em palavras de corréus, delações generosamente premiadas, ao arrepio de literal expressão da lei regente.

Teratológica é a decisão de um juiz federal de Curitiba, competente para os casos decorrentes de contratos da Petrobras, que julga supostos crimes cometidos no estado de São Paulo embora reconheça, literalmente, que no caso que acabou de julgar não havia qualquer relação entre a "propina" e contratos da petrolífera (ainda) estatal brasileira.

Todas essas teratologias jazem, a um tempo silenciosas e eloquentes, na única sentença que, de modo artificial - e, diga-se, igualmente teratólogico - mantém Lula encarcerado, esperando que emerjam a qualquer momento, qual o monstro da lagoa aguardado pelo público atordoado e atento da arquibancada, na genial letra de Chico Buarque e Gilberto Gil.

Se encher as ruas não levará, por si só, juiz algum a dignar-se a pegar uma caneta, ou seu token, para assinar uma ordem de concessão de liberdade ao ex-presidente, é preciso de alguma forma enfiar esse povo todo num instrumento jurídico adentro, que tenha tanto peso quanto a Paulista lotada de ponta a ponta.

O ideal seria que essa multidão firmasse um pedido de habeas corpus gigantesco arrolando, de modo direto, sucinto e objetivo - mais curto do que este meu textão, claro -, todas essas teratologias por mim destacadas. Seria impraticável, eu sei.

Mas é perfeitamente possível conceber um habeas corpus impetrado por um batalhão de grandes juristas do Brasil, como Afrânio Jardim, Celso Antônio Bandeira de Mello, Pedro Estevam Serrano, Dalmo (e Pedro) Dallari, José Eduardo Cardozo, Carol Proner, Gisele Citadino, Eugênio Aragão, Tarso Genro... Com gente da direita e do centro, inconformada com a quebra dos paradigmas do Estado Democrático de Direito, como Cláudio Lembo, que já se manifestou publicamente nesse sentido. Com juízes e promotores, como Marcelo Semer - lembrando que não se trata de manifestação político-partidária. Com ex-ministros do Supremo, como Nelson Jobim e Sepúlveda Pertence (e talvez Eros Grau, César Peluso e Carlos Ayres de Brito).

Enfim, um habeas corpus de peso, de inegável representatividade, que nenhum ministro do STF ou juizeco de esquina de Curitiba possa pensar em desconsiderar.

Uma peça jurídica encabeçada não pelos advogados, digamos, técnicos de Lula, mas por aqueles que têm mais identificação com o universo político, começando por Fernando Haddad, passando por José Roberto Batocchio, Luiz Eduardo Greenhalgh, Paulo Teixeira, Wadih Damous, Gleisi Hoffmann, Henrique Fontana. Sem desprezar, naturalmente, os bravos e valorosos Cristiano Zanin, Valeska Martins e toda a equipe de seu escritório.

A ideia, enfim, é que seja um habeas corpus juridicamente inatacável, essencialmente baseado na sentença, com destaque para os seus trechos mais aberrantes, sem necessidade de revolver provas ou examinar fatos, mas sobretudo politicamente robusto.

Penso que Haddad é a pessoa ideal e necessária para liderar um movimento com esse objetivo.

Eis minha modesta contribuição. Por favor, façam-na chegar a Fernando Haddad.

(Luís Antônio Albiero)

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