24/05/2014

Confissões de um Envelhecente

Não sei se é a idade crescente, se é apenas reflexo da elevação da temperatura eleitoral ou se estou adquirindo dos intolerantes que tanto critico a doença da intolerância, mas é fato que tenho tido cada vez mais dificuldade de conviver em certos ambientes sociais inóspitos à minha opção política.

Há pouco mais de um mês, estava com a família num churrasco na casa de um amigo, sintonizado na conversa de um grupo que discutia amenidades, quando minha sintonia fina, refinada pela mistura de pequenas doses de licor, cerveja e caipirinha, captou um diálogo de dois convivas, ao fundo, ao lado da churrasqueira. Um deles falava baixinho, diferentemente de outras ocasiões em que costumava me aporrinhar de modo proposital, a título de desagradável brincadeira, com suas divagações sobre política salpicadas de desinformação e preconceito. Desta feita, ele cochichava ao outro, destilando com seriedade seu veneno, e por mais que eu tentasse me desligar, não conseguia. Até que ouvi a pérola, "a Dilma era assaltante de banco e por isso botou um monte de ladrões no governo". Aí o sangue ferveu, mas não seria eu a estragar a festa na casa de meus amigos, cunhados do infeliz. Bati forte na mesa, levantei-me e fui embora, para estranheza dos demais, especialmente dos anfitriões. Saí, reconheço, de modo pouco ou nada cortês.

Semanas antes, já havia ocorrido o episódio na livraria de um shopping local, que contei aqui recentemente, em que um grupo de velhinhos comentava sobre o "atraso na educação" do Brasil, atraso calculado pelo próprio grupo em mais de cinquenta anos, mas tudo culpa de Dilma e do PT. Ontem. domingo, após o almoço no mesmo shopping, fomos a outra cafeteria, onde costumamos ir com maior frequência. Mal sentei, observei um sujeito de uns sessenta anos conversando com um casal de idosos. A mulher fazia alguma crítica a "esses deputados" e o tal sexagenário, com cara de empresário e ares soberbos, foi logo dizendo que "o problema do Brasil é que o crime ascendeu ao poder". De novo, não suportei. Eu não conseguiria ouvir tudo aquilo calado e não tinha nenhuma intenção de brigar em público. Levantei-me imediatamente, sem nada consumir, e bati em retirada, dizendo alto que não ficaria ao lado de gente preconceituosa..

Eu que critico tanto a intolerância dos que, por puro ódio ou preconceito, vivem nos agredindo, nos ameaçando, nos condenando, cismo que adquiri dessa gente seu terrível mal. Só que, pelo menos por ora, não saio por aí ofendendo a ninguém. Torço para que não seja um primeiro estágio dessa grave doença contagiosa.

(Luís Antônio Albiero, de Capivari, SP, em Americana, SP, aos 24 de maio de 2014)

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