(Minha niusléter de 25/09/2025)
Dentre as inesgotáveis jabuticabas que brotam por este Brasil adentro, nada há de mais inusitado do que a atuação de uma bancada “trumpista” em pleno Congresso Nacional brasileiro. O Brasil é certamente o único país de todo o universo que tem, no Parlamento, duas bancadas governistas, oponentes entre si: uma formada por aliados do governo do presidente Lula e outra, de aliados do governo de Donald Trump.
A bancada trumpista tem por líder o deputado federal carioca, eleito pelo estado de São Paulo, Eduardo Bolsonaro, aquele cujo pai, na presidência, chegou a cogitar para o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos, por conta de sua fluência num dialeto semelhante ao inglês e pela experiência em fritar hambúrgueres.
A ideia do pai parece que criou frutos tardios nas pretensões do filho, que há pouco mais de 120 dias se licenciou do cargo de deputado para atuar como embaixador de fato junto ao governo Trump. Mudou-se de mala, cuia e família para o grande país do Norte, onde mora numa confortável mansão às custas de PIX que lhe envia o generoso genitor. Eduardo retomou recentemente seu papel de líder da bancada “trumpista”, função que vem exercendo como “D.A.D.”, “deputado à distância”.
O governo de Jair, o pai, foi sabidamente um governo contra o Brasil, composto por ministérios bastante peculiares – outro pé de jabuticaba: ministérios contra a Saúde, contra a Educação, contra a Justiça, contra os Direitos Humanos, contra a Economia… Como o bom fruto não cai longe do pé, Eduardo Bolsonaro resolveu ser também um contraembaixador.
De fato, Dudu tem-se mostrado um exímio negociador. Em pouco tempo, já conseguiu do governo Trump um inédito tarifaço de 50% de taxação sobre as importações de produtos brasileiros, que gerou desemprego e inflação nos Estados Unidos, contribuição inestimável do nosso contraembaixador à autodestruição do império estadunidense desencadeada por seu próprio presidente.
O tarifaço acabou por se transformar num presentaço ao presidente Lula, que, a um ano do pleito em que disputará a reeleição, unificou a parte saudável do povo brasileiro em torno da bandeira da soberania nacional e, de quebra, escancarou de vez, a quem se recusar a fechar os olhos e a fazer ouvidos moucos, o quão nocivo é o bolsonarismo à nação brasileira.
Na esteira das sanções econômicas, vieram imposições políticas que explodiram como Tiu França no Supremo Tribunal Federal brasileiro. Tiu França foi o catarinense que, para demonstrar seu amor à pátria e ao ex-presidente, suicidou-se ao explodir uma bomba no pátio em frente ao STF. Já a bomba lançada por Trump teve melhor sorte e explodiu no interior da Corte, no colo do ministro Alexandre de Moraes, contra quem o governo estadunidense decidiu aplicar a lei Magnistsky.
A intenção, anunciada com pompa e glória pelo próprio Eduardo Bolsonaro e seu parceiro de surto quixotesco Paulo Sancho Pança Figueiredo como grande feito, era fazer com que o STF não condenasse papai Jair pela tentativa de golpe de estado que culminou na quebradeira de 8 de janeiro de 2023.
O feito internacional marcou uma evolução na performance de Eduardo Bolsonaro, que em 2017 chegou a dizer que para fechar o Supremo bastavam um jipe, um cabo e um soldado. Eis que ele convocou Donald Trump como cabo e o soldado Marco Rubio, ministro de Estado dos EUA. Em lugar do jipe, porém, Dudu Bananinha ameaça vir com um avião caça F-35. Um salto e tanto de qualidade, convenhamos.
Imagem: Lockheed Martin F-35 Lightning II. Imagem: Wikipediao
As ameaças proporcionaram a colheita de bom fruto na Primeira Turma do STF, responsável pelo julgamento da entidade Pai Jair. Por fruto, no caso, entenda-se a groselha, frutinha vermelha nativa dos Estados Unidos da qual o Brasil é o quarto maior exportador mundial. Foram quase quatorze horas de xarope de groselha servida pelo ministro Luiz Fux a seus colegas e a todos que tiveram saco (perdoem-me) para assistir ao seu longo, cansativo e inútil voto. Com bomba e com tudo, Pai Jair acabou condenado a 27 anos e três meses de prisão por diversos crimes.
O Brasil adota o regime presidencialista, mas o que não nos falta são reis. Temos um rei para tudo: o do futebol, o do baião, o da soja – e o meu vizinho de parede-meia em Capivari, o da cachaça (pausa para um merchã gratuito: a “Cachaça do Rei” é da boa, eu garanto). Fux se revelou o Rei da Groselha.
O ministro foi escalado pela ex-presidenta Dilma Rousseff em 2011 para integrar a seleção brasileira dos onze do STF. Entrou em campo com a disposição de quem mataria no peito os casos rumorosos pendentes na Corte. Passaram-se quatorze anos e ele resolveu que, finalmente, havia chegado a hora. Matou a bola no peito, fez sua jogada individual dentro das quatro linhas, mas foi logo desarmado e driblado pelos demais integrantes do próprio time.
A jornalista Mônica Bergamo chegou a dizer, semanas antes do julgamento, que Alexandre de Moraes estava isolado na Corte. A realidade mostrou que isolado estava Luiz Fux, e assim tem ficado cada vez mais. Até “búlin” (do inglês “bullying”, que significa… ah, você sabe!) ele sofreu dos colegas no dia seguinte. Confesso que nem me deu pena.
É hábito nas Cortes de justiça do país que, ao final dos votos, o presidente da sessão agradeça ao eminente colega prolator e lhe enalteça o trabalho, elogiando-o pelo “brilhante voto”. O cruel Cristiano Zanin, todavia, nada disse nesse sentido ao final da groselhada, mas bem que poderia ter dito: “agradeço-lhe, ministro, por voto tão Magnitsky”.
(Esta crônica integrará a coletânea “Quando a Constituição Respira”, organizada pela escritora Cleusa Slaviero, a ser lançada em livro em breve pela editora ComPactos)
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Imagem: Lockheed Martin F-35 Lightning II. Imagem: Wikipediao

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