01/01/2022

A Perda de uma Chance

O sujeito é lançado na fogueira e faz campanha para presidente da República por apenas vinte e poucos dias. Mesmo assim, obtém 32 milhões de votos no primeiro turno; vai para o segundo, sua votação cresce por volta de 50% e ele alcança 47 milhões de votos (só perde a eleição para uma máquina poderosa de feiquenius e pela providencial facada encenada que poupou o adversário do debate cara-a-cara).

Foi ministro da Educação por oito anos; prefeito de São Paulo; é professor universitário, advogado, economista e cientista político.

É pré-candidato a governador do estado de São Paulo e aparece como líder em todas as pesquisas de intenção de votos.

Um sujeito com todas essas qualificações abre mão de outros compromissos certamente mais importantes e se dispõe a conceder uma entrevista (*) à rádio da minha pequena cidade, e o faz exibindo toda sua boa vontade. Propõe-se a discutir os problemas do país, do estado, da região; traz luzes importantes para a compreensão da realidade, da conjuntura atual; e o que faz um bando de cidadãos despreocupados com o próprio futuro? Limita-se a xingá-lo.

Foi uma excelente entrevista, conduzida com maturidade pelo amigo Marcos Graziani e por Tony Machado, uma felicíssima iniciativa do proprietário, também velho amigo Carlos Maschietto, o Carlão (que, por sinal, hoje mesmo perdeu o pai, o estimado Mário Maschietto, que deixou viúva a professora Zilce - irmã do ex-ministro do trabalho, Almir Pazzianotto Pinto -, além dos demais filhos, minha querida colega de bancos escolares e de faculdade María Cristina, Maria Aparecida e o procurador da Câmara Municipal de São Paulo, Mário Sérgio Maschietto. Minhas condolências a todos os familiares e amigos).

Haddad falou sobre os projetos que o PT elaborou, sob seu comando, como presidente da Fundação Perseu Abramo, caso o partido volte a governar o país, com ele mesmo ou, mais provavelmente, com Lula presidente a partir de 2023, além de discutir questões regionais e de interesse do estado de São Paulo.

A nota negativa foi para o interesse demonstrado pelos que se pretendem críticos do PT, que inundaram o perfil da rádio no Facebook com todo preconceito e ódio que contaminaram o debate público no país nos últimos anos.

Um robô intitulado Rico Stark chamou o entrevistado de "poste" e "lixo"; um cidadão de nome Osvaldo Rodrigues tirou, sabe-se lá de que latrina, a informação de que ele "não sabe nem cantar o hino nacional".

O dentista (acho que é isso) Ivan Schincariol, figura conhecida na cidade, chamou-o de "porcaria". Vera Assis, de "isso" ("isso nem merece comentário" - foi o comentário que ela, muito coerentemente, lá deixou, no Facebook da rádio). Rodrigo Ramos, de "uma pessoa dessa" ("como podem dar espaço a uma pessoa dessa", seguido de três pontos de exclamação).

Maria de F Prado expressou uma espécie de fé em Fernando Haddad e pespegou-lhe um "credo Deus". FerLuis repetiu que ele é "piada". Doroti Silva considerou-o "decadência".

Lucia Marturano conseguiu clicar cinco vezes num mesmo emoji (😡😡😡😡😡). Célia Martins foi mais longe e teve êxito na digitação de duas diferentes carinhas prontas ("🤔🙈🙈🙈"), assim como Cesar Caldas ("😱🤮").

Luís Rocha viu no entrevistado uma "misericórdia amarrada", seja lá que bobagem isso possa significar.

O megaempresário bilionário listado pela revista Forbes, dos Estados Unidos, meu amigo de longa data Costa Costinha sentiu algum "odor" estranho nas imediações da rádio e chamou o convidado de "tranqueira".

Jonas Rocha foi outro que viu "piada", sabe-se lá onde e por que. Rodrigo Lucca, "bosta". Dinamar Rodrigues, outra cheia de fé em Haddad, orou o "credo".

Rico Stark, o robô muito atuante, voltou para referir-se a ele como "comédia".

Davi Serafim, certamente um mestre na arte, comentou que "essa entrevista vai ensinar Cmo roubar o povo" e, muito criativo, repetiu o robô, afirmando que ele é "poste" e "lixo".

Endne Ferreira de Lima considerou-o "pilantra" e Claudinei Ferreira de Jesus voltou a falar em "piada", a bufonada campeã dos comentários. Três aparições, já pode pedir música. É fantástico!

Já Valdemir Santos, esse sim, fez a ofensa que considerei a mais dolorosa, pois xingou Fernando Haddad de "Bolsonaro", seguido do enigmático número "2022".

Enfim, debater a pandemia, a educação, a volta às aulas presenciais, o auxílio emergencial, nada. Nenhuma palavra dos inteligentes comentaristas.

Críticas úteis ou ao menos substanciosas, zero. Nem para dizerem o que têm contra o fato de Fernando Haddad ter criado o SISU, o ProUni, ter construído catorze universidades federais e mais de cem novos "campi", e ter mais que dobrado o número de estudantes no ensino universitário enquanto serviu como Ministro da Educação.

Ou por que são contrários a ele ter criado as ciclofaixas, ampliado os corredores de ônibus, promovido a integração entre ônibus e metrô, quando prefeito de São Paulo.

Nada disso.

Essa gente, para lá de inteligente, só soube xingar o ilustre convidado da rádio local.

Esse não é o povo da minha Capivari, mas é parte, uma parte significativa que bem o representa. E por aí se vê por quais razões a cidade caminha para trás.

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