Além de confusão em relação ao que está acontecendo no Brasil, essa pessoa revela uma absoluta ausência de percepção histórica. Como assim, jamais será vermelha? O que a pessoa tem contra a cor, apenas uma cor?
Ignora a pessoa que, antes de os portugueses aqui aportarem, o Brasil existiu sob o signo do vermelho. Aqui sempre reinou soberana a enorme bola de fogo que do céu nos alumia e que ostenta fulgurante cor escarlate. Que dês d’antanho avermelhava a pele dos primeiros habitantes, que andavam pelados por esta imensa Pindorama. Tão pelados que os gajos d’além-mar, quando enfim cá chegaram enfiados em vestes grossas e pesadas que lhes causavam mal-estar e cheiro horrível, ruborizados ao se deparar com pintos e seios balouçantes e pererecas à mostra, chamaram aos aborígenes de “peles vermelhas”.
Ignora mais o infeliz, que o que de fato atraiu os portugueses, nos primórdios, foi uma árvore chamada pau-brasil, uma madeira resistente e vermelha da qual se extraía um pigmento de igual coloração, usado em pinturas e tingimentos. Aliás, o nome Brasil, assim como o da árvore que o inspirou, vem de brasa, de braseiro, da cor avermelhada de um pedaço de pau em chamas.
Há quem jure que o vermelho seja a primeira cor que o bebê enxerga e que teria sido a primeira que o homem batizou. É a cor do sangue que corre nas minhas veias, nas suas, prezado leitor, e – pasmem! – até mesmo nas entranhas dessa gente que a repugna sem saber por que. Por ser a cor do fogo e do sangue, é tida como a cor da paixão e do amor.
A igreja católica usa o vermelho para simbolizar o sangue e a vida de Jesus. As batas dos sacerdotes, o manto do altar são do mesmo tom nos dias em que se comemora a Paixão de Cristo, o Domingo de Ramos e a Sexta-feira santa. E eu fico só imaginando os católicos reacionários mais empedernidos fazendo igual campanha contra o “esquerdopapa” Francisco usando o lema “o sangue de Jesus jamais será vermelho!”
Especialistas afirmam que existem 105 tons de vermelho. É a cor por excelência, tanto que em espanhol se diz “colorado”, de colorido.
Nada obstante todo esse portfólio positivo da magenta, esse pedigree do sanguíneo, esse curriculum vitae invejável da piranga dos índios, a cor passou a ser tratada como em oposição às cores da bandeira brasileira, especialmente da dupla verde e amarelo que caracteriza a camiseta da CBF. Quem pagou o pato, quem diria, foi a gloriosa seleção canarinha, cinco vezes campeã mundial, na iminência de conquistar – tomara! – o sexto título.
Tanta ojeriza essa gente dedicou ao vermelho, por sua associação à ideologia de esquerda, que a direita quis se apropriar com exclusividade do verde-amarelo. Um símbolo nacional, cores oficiais da pátria brasileira, foi sequestrado por fanáticos cegos de ódio que foram às ruas seguindo o Pato Amarelo da FIESP, manipulados pela Globo, pedir um golpe de estado! Foram vestidos de dourado, mas vermelhos de rancor, espumando furiosos e brandindo a bandeira brasileira, dizendo que esta jamais terá a cor que desde a origem nos simboliza.
O mico foi tanto, a demonstração de estupidez tão extraordinária, que essa gente, que pôs no lugar da presidenta honesta a mais insaciável quadrilha de corruptos da História do país, hoje fica ruborizada de vergonha e, em plena Copa do Mundo de futebol, não tem mais coragem de usar a camiseta verde-amarela da CBF. O uniforme, antes sucesso comercial, encalhou e deu prejuízo a quem apostou nas vendas, deixou no vermelho os comerciantes mais entusiasmados.
Do lado do time da esquerda, os vermelhos como eu têm receio de, usando a camisa oficial da seleção, serem confundidos com os manifestoches, temem passar de otários. Ou seja, acabam sucumbindo ao sequestro do verde e do amarelo engendrado pela turma da direita.
É, porém, chegada a hora do resgate! É o momento de retomarmos o verde, o amarelo, o azul e o branco, as cores da bandeira do Brasil, para todos. Afinal, são um símbolo nacional e a todos pertencem, da esquerda à direita.
Aproveitemos a oportunidade que nos proporciona a Copa do Mundo da vermelhíssima Rússia e vamos, orgulhosos, vestir a camisa da seleção canarinha.
Eu já encomendei a minha, predominantemente amarela, verde no colarinho e no punho,em que o símbolo da corrupta CBF é substituído por uma gaiola aberta, de dentro da qual sai, como num chute, uma estrela vermelha, acompanhada de outras quatro menores, indicando que a esperança segue rumo à sua quinta vitória contra o ódio, e de uma frase em que se pede a liberdade daquele que caminha para completar seu tríplex eleitoral.
O país é nosso, a seleção não pertence à CBF, o futebol é o esporte preferido da maior parte dos brasileiros e a direita não tem o monopólio das cores nacionais. Não há razão para sucumbirmos e deixarmos de exercitar mais uma vez, em plenitude, nossa paixão coletiva maior. Tenhamos perspectiva histórica.
E que venha o hexa! Vai, Brasil!
(LUÍS ANTÔNIO ALBIERO, em Capivari, SP, aos 23 de junho de 2018)
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