13/12/2020

Nós Contra Eles

Têm razão os que atribuem ao Petê a culpa pelo divisionismo que caracteriza o país nos últimos quinhentos anos, pelo menos.

Primeiro, o Petê criou o homem, a quem chamou de Adão. De sua costela, fez a mulher, Eva. Depois, criou a ideologia de gênero e foi misturando tudo, Adão e Eva, Adão e Evo, Eva e Ada, Eva e Adão, essa pouca vergonha toda. Começou assim a suruba de letrinhas que no princípio era só LGBT, mas que, com o tempo, ganhou um QI a mais.

Depois, um índio barbudo e de nove dedos, barrigudinho e com fala rouca, incitou seus companheiros que passavam o tempo vagabundeando peladões pela mata verde de Pindorama a resistirem aos navegantes portugueses. Foram dizimados por estes e, para felicidade geral da Nação recém-inaugurada, acabou aquela divisão maléfica introduzida pelo Petê do "nós versus eles".

Mas a petezada não se contentava com a paz social reinante e mandou buscar negros na África, para escravizá-los e criar assim, artificialmente, mais uma divisão: a "senzala" contra a "casa grande".

E assim tem sido até hoje.

O Petê, por exemplo, foi que inventou que apenas homens ricos e proprietários de terras poderiam votar, só para incitar a sociedade a lutar pelo voto universal, incluindo pobres, mulheres, analfabetos, essa rempa toda. E negros, claro - que era para sustentar a falsa ideia de que havia racismo no Brasil. Racismo que hoje em dia ganhou até sobrenome, "estrutural", mas sabemos que isso não existe em nosso país, é mito.

Foi o Petê que instigou João Goulart a falar em reforma agrária, e isso apenas para despertar a ira dos conservadores e dos militares que, patrioticamente, se viram obrigados a combater o comunismo e assim conservar seus privilégios conquistados pela meritocracia e pelo suor da graça divina.

E também foi o Petê que criou a classe trabalhadora para brigar com patrões honestos e justos por aumentos salariais abusivos, cestas básicas, férias remuneradas, décimo terceiro, vale-transporte e outras mamatas do gênero.

Enfim, esse Petê tudo o que faz desde os primórdios é dividir a sociedade, apenas para ter uma falsa bandeira pela qual possa fingir lutar e com essa estratégia ganhar eleição após eleição, enganando os incautos, aos quais compra o voto com bolsa-família e pão com mortadela.

Tem sido assim desde que o cacique Nuvem Vermelha do B, um aborígene apodado Lula, venceu a primeira eleição entre indígenas, bem antes da chegada dos europeus, lá pelo ano mil quatrocentos e nove dedos - o tempo, àquela época, era contado em dígitos que iam sendo decepados do líder máximo da indiada quando se completava um período ânuo -, e estabeleceu essa hegemonia política petista que vige até hoje.

12/12/2020

Mas e o PT?

Na página da Gleisi Hoffmann, minha resposta ao comentário abaixo (imagem):

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Verdade, Patrick Portugal . Você tem toda razão.

Primeiro, o PT criou o homem, a quem chamou de Adão. De sua costela, fez a mulher, Eva. Depois foi misturando tudo, Adão e Eva, Adão e Evo, Eva e Ada, Eva e Adão. Começou assim aquela suruba de letrinhas que no princípio era só LGBT, mas que, com o tempo, ganhou um QI a mais.

Depois, um índio barbudo e de nove dedos, barrigudinho e com fala rouca, incitou seus companheiros que vagabundeavam peladões pela mata verde de Pindorama a resistirem aos navegantes portugueses. Foram dizimados por estes e, para felicidade geral da Nação recém-inaugurada, acabou aquela divisão maléfica introduzida pelo PT do "nós versus eles".

Mas a petezada não se contentava com a paz social reinante e mandou buscar negros na África, para escravizá-los e criar assim, artificialmente, mais uma divisão: a "senzala" contra a "casa grande".

E assim tem sido até hoje.

O PT, por exemplo, foi que inventou que apenas homens ricos e proprietários de terras poderiam votar, só para incitar a sociedade a lutar pelo voto universal, incluindo pobres, mulheres, analfabetos, essa rempa toda. E negros, claro - que era para sustentar a falsa ideia de que havia racismo no Brasil. Racismo que hoje em dia ganhou até sobrenome, "estrutural", mas sabemos que isso não existe em nosso país, é mito.

Foi o PT que instigou João Goulart a falar em reforma agrária, e isso apenas para despertar a ira dos conservadores e dos militares que, patrioticamente, se viram obrigados a combater o comunismo e assim conservar seus privilégios conquistados pela graça divina e meritocracia.

E também foi o PT que criou a classe trabalhadora para brigar com patrões honestos e justos por aumentos salariais abusivos, cestas básicas, férias remuneradas, décimo terceiro, vale-transporte e outras mamatas do gênero.

Enfim, esse PT tudo o que faz é dividir a sociedade, apenas para ter uma falsa bandeira pela qual possa fingir lutar e com essa estratégia ganhar eleição após eleição, enganando os incautos, aos quais compra o voto com bolsa-família e pão com mortadela.

Tem sido assim desde que um aborígene apodado Lula venceu a primeira eleição entre indígenas, bem antes da chegada dos europeus, lá pelo ano mil quatrocentos e nove dedos - o tempo, àquela época, era contado em dígitos que iam sendo decepados do líder máximo da indiada quando se completava um período ânuo -, e estabeleceu essa hegemonia política petista que vige até hoje.

02/11/2020

"Fez Sem Roubar", Isso Sim

Sebastião é um homem simples de minha cidade que se ofereceu em grupos locais no Facebook para segurar bandeira em favor de qualquer candidato que pudesse pagar-lhe algo, já que está desempregado.

Não demorou e apareceram os debochadores, os que não têm respeito ao outro, e Sebastião acabou se revelando eleitor de Lula, a quem é grato por ter-se beneficiado das políticas públicas empreendidas pelo ex-presidente.

O bullying contra Sebastião só cresceu e ele caiu na armadilha de "reconhecer" que "Lula roubou, mas fez".

Enviei-lhe o seguinte comentário:

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Sebastiao, meu caro. De uma vez por todas, LULA NÃO ROUBOU NADA!

Lula é a pessoa mais investigada de toda a história deste país, desde que ele surgiu no final dos anos 70 desafiando o regime militar.

Lula, desde então, vem sendo vigiado vinte e quatro horas por dia.

E, a despeito disso, NADA ENCONTRARAM de irregular em contas, no Brasil ou no exterior, nem de Lula, nem da falecida esposa, nem dia filhos, noras, assessores, aliados, filiados, parentes, amigos. NADA!

Você viu alguma operação da polícia Federal- ou qualquer outra polícia, do Brasil ou do mundo - que tenha encontrado dinheiro, em real, dólar, euro ou qualquer moeda do mundo - escondido em algum apartamento, como acharam com Geddel Vieira?

Você viu alguma operação que tenha encontrado alguma joia valiosa, algum quadro de grande valor, algum carrão com Lula ou com algum filho dele, irmão, parente, assessor, amigo próximo ou aliado político, como encontraram com Sérgio Cabral?

Você viu encontrarem terrenos, prédios, apartamentos em nome de Lula, seus parentes ou "laranjas", como encontraram com BolsoNero e seus filhos?

Você viu alguma operação policial que tenha encontrado dinheiro em conta-corrente, no Brasil ou no mundo, em nome de Lula, da falecida esposa, de filhos, irmãos, parentes, assessores, aliados, que fosse dinheiro irregular, fruto de corrupção ou qualquer outro crime, como encontraram com Eduardo Cunha?

Tudo o que encontraram foi o que a empresa de Lula arrecadou com as palestras que Lula concedeu mundo afora, pelas quais cobrava o mesmo valor que cobram Bill Clinton, Barack Obama e outros ex-chefes de Estado do mundo.

Os que se posicionam como inimigos de Lula jamais aceitarão isso, porque são, antes de tudo, preconceituosos e não admitem que Lula possa fazer palestra, possa atrair a atenção de pessoas mundo afora que pagam para vê-lo falar.

E recentemente, há menos de quinze dias, a juíza da Lava Jato de Curitiba concluiu que as palestras de fato ocorreram (estão todas registradas em vídeos), são legítimas, os valores arrecadados estão declarados à receita e foram recolhidos os valores devidos ao imposto de renda.

De todas as bobagens de que acusaram Lula, ele só foi condenado por dois fatos - apenas DOIS! - que a rigor não constituem crimes.

Ele foi condenado pela reforma que a OAS fez no apartamento dela própria, que nunca foi de Lula, não é dele, jamais será e jamais seria. Foi condenado porque o juiz que o condenou já havia acertado ir para o cargo de ministro da justiça do candidato que, com a prisão de Lula, venceria a eleição, como de fato venceu. Como, de fato, BolsoNero levou o corrupto Sérgio Moro ao ministério da justiça, com promessa de, adiante, ir ao STF (ele acabou foi ganhando um belo pé na bunda!).

E depois foi condenado, numa sentença absolutamente idêntica à do apartamento (um "copia e cola") por outra reforma, aquela no sítio dos filhos do Jacó Bittar, que estão vendendo o sítio neste momento. Ou seja, outra reforma numa propriedade imóvel que nunca foi, não seria e jamais será de Lula!

Agora, RACIOCINE.

Se esse José Henrique Mentiras BolsoNero Russo fosse o presidente da República, como Lula foi, por oito anos, período em que administrou mais de DEZ TRILHÕES de reais, e se esse José aí fosse corrupto como ele diz que Lula é, você acha que esse José Henrique teria se contentado em receber, no fim das contas, apenas DUAS REFORMAS em propriedades que nunca foram, não são e jamais seriam ou serão dele?

Por outra, será que Deltan Dallagnol, Sérgio Moro e todos os delegados, promotores, procuradores e juízes do Brasil inteiro são tão incompetentes que não conseguiram encontrar nada além dessas duas reforminhas?!?

Pois é, cara!

A verdade é dura, é pesada, principalmente quando vai contra tudo e tanto que se mentiu contra Lula, mas nós temos que ter a força, a hombridade, a coragem de dizer a quem puder nos ouvir:

LULA É HONESTO!

Dizer que Lula "roubou mas fez" é cair na armadilha deles, no jogo deles, porque é exatamente isso que eles querem que você diga: que Lula fez (porque de fato foi o presidente que mais fez pelo povo brasileiro, sobretudo pelos mais pobres, e isso eles não têm como negar), mas "roubou" (portanto, é desonesto e merece ir para o lixo da história), quando na verdade LULA NADA ROUBOU!

A Lava Jato foi um imenso ATESTADO DE HONESTIDADE a Lula.

O resto é preconceito, é despeito, é inveja, é pequenez de espírito, é ódio.

15/10/2020

E se o Arapiraca for Campeão?

Juiz distraído de Arapiraca anulou sua própria sentença que cancelava um dos 33 títulos de Doutor Honoris Causae conquistados no Brasil e no mundo pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. Culpou um clique "involuntário" e deletou do mundo jurídico a sentença que cassava o título porque um futuro condenado não era digno de tal honraria.

Fico imaginando se idêntica homenagem a universidade arapiraquense resolvesse conceder a Nelson Mandela, Jesus Cristo ou Tiradentes, o que faria o obscuro magistrado. Certamente faria o mesmo, considerando que tais personalidades históricas alguma devem ter aprontado para merecerem a prisão, a cruz e a forca.

Na música "E Se...", Chico Buarque e Francis Hime citam em criativos versos diversas situações quase impossíveis de acontecer, como o oceano incendiar, cair neve no sertão, urubu cocorocar, o Botafogo vencer um campeonato e, pasmem, o Pantanal virar pirão!

Pois é. Algumas hoje soam como profecia.

Por exemplo, o ASA, célebre time de Arapiraca, uma das principais cidades de Alagoas, já foi campeão estadual algumas vezes - até já cometeu o horrível feito de tirar o glorioso Palmeiras de uma edição qualquer da Copa do Brasil! -, mas o Pão de Açúcar ainda não desmanchou, o sol não raiou à meia noite, o carnaval não caiu em abril (não se sabe quando será o primeiro pós-pandemia), embora já tenha tido ex-presidente que garantiu mais do que bife no jantar e sopa para peão, cujo estômago hoje certamente ronca vazio de alimento e cheio de saudades.

O que ninguém poderia imaginar é que um juiz de Arapiraca anulasse um título de Honoris Causae concedido ao ex-presidente campeão no combate à fome e na construção de universidades, para citar apenas dois de seus feitos que antes jamais sequer passariam pela imaginação fértil de gênios como Chico e Hime e que lhe garantiram o justo e devido reconhecimento da Universidade Estadual de Alagoas.

Muito menos que o mesmo juiz, abdicando de sua condição divina - ora, ora, quem diria!? -, anulasse a sua própria sentença, sem ao menos ter sido provocado por embargos declaratórios, não por reconhecer a esdruxularia e a inconstitucionalidade que praticou, já que passou a boiada sobre a autonomia universitária, mas para minimizar a repercussão nacional negativa que o caso teve. Sobretudo depois que se descobriu que Sua Excelência, esse lentíssimo juiz, está mais para Íbis, time de futebol do interior de Pernambuco que ganhou a fama de o pior do planeta, do que para o consagrado ASA de Arapiraca.

(LUÍS ANTÔNIO ALBIERO, em Jacareí, SP, 15 de outubro de 2020)

********

E SE...

(https://youtu.be/NmXwfI1VQ9M)

se o oceano incendiar

E se cair neve no sertão

E se o urubu cocorocar

E se o botafogo for campeão

E se o meu dinheiro não faltar

E se o delegado for gentil

E se tiver bife no jantar

E se o carnaval cair em abril

E se o telefone funcionar

E se o pantanal virar pirão

E se o Pão-de-Açúcar desmanchar

E se tiver sopa pro peão

E se o oceano incendiar

E se o Arapiraca for campeão

E se a meia-noite o sol raiar

E se o meu país for um jardim

E se eu convidá-la para dançar

E se ela ficar assim, assim

E se eu lhe entregar meu coração

E meu coração for um quindim

E se o meu amor gostar então de mim

( E se o oceano incendiar

E se cair neve no sertão

E se o urubu cocorocar

E se o botafogo for campeão

E se o meu dinheiro não faltar

E se o delegado for gentil

E se tiver bife no jantar

E se o carnaval cair em abril

E se o telefone funcionar

E se o pantanal virar pirão

E se o Pão-de-Açúcar desmanchar

E se tiver sopa pro peão

E se o oceano incendiar

E se o Arapiraca for campeão

E se a meia-noite o sol raiar

E se o meu país for um jardim

E se eu convidá-la para dançar

E se ela ficar assim, assim

E se eu lhe entregar meu coração

E meu coração for um quindim

E se o meu amor gostar então de mim

23/07/2020

Ser Filho, Ser Pai

Julho é mesmo um mês decisivo em minha vida, para o bem e para o mal.

Foi em 19 de julho do ano da graça de 1968, "o ano que não terminou" (título do livro do jornalista Zuenir Ventura, sobre os anos de chumbo), que meu pai faleceu, aos quarenta anos de idade. Bota chumbo nisso! Eu tinha apenas quatro e meio.

No mesmo dia, só que em 1975, foi-se o pai dele, meu nono Antônio Albiero, o "Tone", e em 16 do mesmo mês, no ano seguinte, foi-se minha nona Natalina Pellegrini, a "Nina". Em 1974, no primeiro dia de julho, já se havia partido meu avô materno, Roque Alexandre Feliciano, o "Roquinho".

Passada essa onda nefasta, porém, os julhos seguintes só me reservaram alegrias. Em 20 de julho de 1991 eu e Luciana nos casamos e em 23 do mesmo mês, do ano de 1997, nasceu meu filho Estêvão.

Hoje, portanto, 23 de julho de 2020, meu filhote está completando 23 anos de idade. Aquele bebê que dormia em minha barriga, então não tão proeminente como a que hoje ostento, já é homem feito.

Por toda minha infância eu senti a ausência de meu pai, e sinto até hoje, a despeito das tão poucas, mas muito boas lembranças que trago dele. Já escrevi a respeito, numa crônica.

A ausência da figura paterna despertou em mim, desde muito cedo, o desejo de ser pai. Minha primeira filha, Mariana, porém, não sobreviveu a um parto prematuro. Resistiu bravamente por 24 dias, inteiramente vividos na UTI neonatal do hospital Maternidade, de Campinas. Ela teria hoje 25 anos de idade.

Sua perda reforçou em mim o desejo de ser pai de fato e eu sonhava não ser um pai qualquer. Queria ser o melhor pai do mundo, como eu imaginava que teria sido o meu, Ildefonso, de apelido "Nego", de cujo caráter tudo o que sei, pela unanimidade dos que o conheceram, é que ele foi "um homem bom".

Recolho esses testemunhos dos que com ele conviveram como minha herança, que ele me transmitiu sem que eu percebesse. Não houve tempo, afinal, de ele me passar de modo direto alguma lição de vida. Não me lembro de nenhum conselho e de nenhuma repreensão que ele me tenha feito. Recebo o legado, portanto, pela via indireta dos que o conheceram e que se resume a essas três palavras, "um homem bom". E tento transferir essa preciosidade ao meu filho.

Reconheço que há vezes, porém, em que perco oportunidades de fazê-lo de modo mais concreto, por palavras ou por atitudes.

Lamento não ter sido aquele pai que leva o filho ao clube, ao futebol, sequer para assistir a jogos, como eu adorava na adolescência, paixão que arrefeceu depois que me casei e fui brindado com a paternidade. Algumas vezes o levei a bailinhos de carnaval e houve uma única ocasião em que pescamos juntos. À praia, duas vezes - se não estou errando nas contas.

Definitivamente, não sou o melhor pai do mundo. E certamente há vezes em que chego mais perto dos piores nessa mágica experiência da paternidade, mas tenho certeza de que me esforço para ser o que me parece o ideal. Tenho consciência de que não consigo.

Hoje Estêvão comemora seus 23 anos de idade e eu estou a mais de duzentos quilômetros de distância dele, que ficou em Americana, onde faz o curso de Jogos Digitais na Fatec. Distância que nos finais de semana eu percorro para nos juntarmos na casa de Capivari, realidade que já não é mais possível para os avós Apparecida, minha mãe, a"vó Cida", Maria do Carmo Janotta, "vó Carmo", e Geraldo Falcirolli, o "vô Lalo", meus sogros, já falecidos, muito menos para meu pai, que meu filho passou muito longe de conhecer e, portanto, jamais teve a oportunidade de chamar de "vô Nego", tampouco para a irmãzinha Mariana.

Eu sonhava, para ele, uma USP, uma Unicamp ou Unesp, ou alguma das federais do país, e ele poderia tranquilamente ter ido para qualquer delas. Eu desejava que ele tivesse a convivência intelectual, cultural e política que o ambiente universitário pode proporcionar, que em parte eu vivenciei nos tempos da boa e velha Unimep, instituição privada de Piracicaba em que fiz o curso noturno de Direito, de boa qualidade, é verdade, embora distante da excelência que se alardeia das públicas. Ele foi pragmático e optou pelo curso que ele quis, e ponto final.

Ao contrário de me desgostar, a escolha me fez ver que meu filho tem personalidade, que sabe o que quer e não se preocupa com veleidades. Estou certo de que ele tomou o melhor caminho.

Tudo isso para dizer, neste dia de seu aniversário, que eu estou, aliás, que sou muito orgulhoso do meu filho. Dizer a ele que sempre poderá contar comigo para o que der e vier. E pedir-lhe perdão pelas vezes em que, querendo ser o melhor pai do mundo, acabei sendo ou me aproximando do contrário.

E que amo muito você, meu filho.

11/07/2020

Perdoo-te por te Trair

O editorial do jornal "O Globo", publicado ontem (*), em que a rede empresarial de comunicação expõe sua pretensão de "perdoar o PT", é de um cinismo e de uma hipocrisia que provocam engulhos em qualquer ser minimamente inteligente.

No fundo, no fundo, a empresa reconhece que o Partido dos Trabalhadores representa, de fato e de direito, um imenso contingente da população brasileira, que vai muito além dos 30% mencionados no editorial, que, em reiteradas pesquisas, há décadas vêm expressando ter o PT como sua preferência eleitoral. Um público consumidor de sua produção que ela perdeu e tenta recuperar.

Trinta por cento não vencem uma eleição, de modo que a votação obtida pelo partido desde sua fundação, desde sua primeira participação numa eleição presidencial - a primeira ocorrida após longo período ditatorial de quase um quarto de século -, é demonstrativa de sua força.

A partir das célebres eleições de 1989, o PT disputou todos os segundos turnos havidos (1989, 2002, 2006, 2010, 2014 e 2018), dos quais venceu quatro sucessivos, e foi segundo colocado nos dois únicos pleitos resolvidos em primeiro turno (1994 e 1998).

Ao longo dessas quatro décadas, PT resistiu a avalanches como o mensalão, invenção de Roberto Jefferson que mereceu entusiasmado apoio da Rede Globo e contou com o beneplácito - ou "maleplácito", ficaria melhor - da maioria dos ministros do STF, e da Lava Jato, em que a mesma emissora incensou e transformou em herois um juiz e seus procuradores amestrados e corruptos, cujas reais e malévolas intenções, a pouco e pouco, estão vindo à tona.

Os donos da empresa, conhecida especialmente pela chamada "Vênus Platinada", finalmente se deram conta da amplitude e força do partido ao qual, desde sua fundação, tem-se dedicado a atacar impiedosamente. Lula e suas mais de quatrocentas horas de difamação no Jornal Nacional que o digam.

O editorial, portanto, não é um "perdão" que, sem autoridade alguma, pretende "conceder" ao partido que sempre odiou e continuará odiando, mas uma espécie de pedido envergonhado de desculpas ao povo brasileiro.

O pedido enrustido de perdão da Globo é uma tentativa arrogante e oportunística de recuperar essa parte qualificada do povo brasileiro, representado pelo PT, que são os filiados, os simpatizantes e os eleitores do partido, que não são cegos e sabem o que a Globo fez nos verões, outonos, invernos e primaveras das quatro décadas passadas - e nas cinco anteriores.

É, portanto, uma obra de ficção que pouco oferece para ser levada a sério, o que me fez lembrar de "Perdoa-me por Me Traíres", do genial dramaturgo de direita Nelson Rodrigues.

Em "O Anjo Pornográfico", biografia de Rodrigues escrita por Ruy Castro, há uma passagem em que o autor de "Véu de Noiva", "Boca de Ouro" e outras obras de igual importância afirma que "para salvar a platéia é preciso encher o palco de assassinos, adúlteros, de insanos e, em suma de uma salada de monstros. São os nossos monstros, dos quais eventualmente nos libertamos, para depois recriá-los. (Nelson Rodrigues, O Anjo Pornográfico, pág.273.)"

Parece que a Globo se deu conta dos monstros que ao longo do tempo criou, responsáveis pela conjuntura política atual em que a empresa vê ameaçada sua sobrevivência, uma "salada de monstros" que preparou e temperou com esmero e agora não sabe como devorar.

Na letra de "Mil Perdões", Chico Buarque de Holanda, outro gênio da literatura nacional, este de esquerda, criou versos em que diz "Te perdoo porque choras / Quando eu choro de rir / Te perdoo / Por te trair".

O editorial d'O Globo, como a peça de teatro e a letra da música, é uma ode ao cinismo e à hipocrisia - que se resume no título deste texto, "perdoo-te por te trair". É, de fato, como se "perdoasse" o povo brasileiro pela traição que a empresa, reiteradamente, ao longo de mais de nove décadas, vem praticando contra quem a sustenta, que é representado na política pelo Partido dos Trabalhadores. Que - digo por mim, não pela instituição, mas sei que falo por milhões de petistas - não perdoa a Globo pelas mentiras contadas e estragos causados à Democracia do país.

(*) https://oglobo.globo.com/opiniao/e-hora-de-perdoar-pt-24527685

(Luís Antônio Albiero, em Capivari, SP, 11 de julho de 2020)

21/05/2020

Duas Palavrinhas

Permita-me duas palavrinhas, por obséquio.

"Ah, mas você passa pano para seu bandido de estimação" - é o que estou cansado de ouvir e ler no esgoto aberto que são as redes sociais. Não, meu amigo, não passo pano para bandido algum, nem para ninguém - mas faço questão mesmo é de não passar pano para a injustiça. Se o preço que hei de pagar por empreender uma luta diuturna contra as injustiças - tem sido assim há meio século! - é ser chamado de "fanático", sim, pagarei com gosto. Não concordo, mas sucumbo. Chame-me como quiser.

Tenho para mim que o fanatismo é fruto da cegueira, e cego é o que não sou. Fanático é o sujeito que acredita no que não tem expressão concreta na realidade. Se você me diz que fulano é "ladrão" e eu quero que você me informe dados, situações, datas, horários, locais, objetos roubados por esse seu "ladrão", e você não é capaz de me dizer, acho melhor você reavaliar quem dentre nós é, de fato, o "fanático". Pois se eu peço dados objetivos e você me vem como frases prontas, "memes" produzidos em gabinetes de ódio e usinas de "fake news", repetições genéricas do que a mídia inculcou lenta, gradual e seguramente em seu frágil espírito, em doses homeopáticas, e você não foi capaz de raciocinar a respeito, não teve forças para enfrentar o leão, tenho para mim que o fanático, sem aspas, é você.

"Ah, mas quando chamo fulano de ladrão, é minha opinião, respeite". Respeito uma ova! Acusação, ofensa, injúria, não é "opinião", não é "liberdade de expressão". É crime. Cadeia, velho - ou velha! Código Penal, artigo 140, pena de detenção, de um a seis meses, ou multa, sem contar a indenização por dano moral, custeio do seu advogado, do advogado contrário, das custas do processo. Prepare o bolso.

Suponhamos que você se chame João, ou Joana, e eu resolva sair por aí dizendo que "João é ladrão", ou que "Joana é uma ladra", eu posso? Você, João ou Joana, aceitaria assim, na boa? "Ah, é liberdade de expressão, é só uma opinião" - você concordaria? Pois é, cara!

Claro, você já percebeu que estou falando de Lula. Bingo!

Sim, você tem direito de criticar o ex-presidente pelas políticas públicas que empreendeu quando governou o país. Pode achar que o bolsa-família foi um exagero, ou que foi tímido demais, que a política econômica foi equivocada, que não deveria priorizar o combate à fome, mas privatizar o que FHC não conseguiu, que houve excesso de republicanismo, que não deveria ter melhorado as condições para atuação da Polícia Federal, nem dado tanta liberdade ao Ministério Público, por exemplo. Tudo bem. Aceitável. Críticas de ordem política. Mas não pode negar as evidências, os dados oficiais, as estatísticas. O Brasil melhorou muito durante os oito anos de seu governo - e continuou melhorando com Dilma, até que a golpearam. Melhorou sobretudo sua imagem no cenário internacional. O Brasil passou a ser respeitado. Tínhamos um presidente que nos causava orgulho.

"Ah, mas era a velha política do 'rouba mas faz'", objetará você. Cara, você é cheio dos "ah mas", hein! Voltemos ao início: o que foi que o cara, esse "ladrão" da sua imaginação, roubou? Quando? Como? Onde? Cadê as provas?

"Ah, mas ele foi condenado e a sentença foi confirmada por duzentos e cinquenta e sete tribunais". Vou lhe explicar. Didaticamente.

Lula não foi condenado por ter "roubado" coisa alguma. Foi condenado por uma reforma que ele não pediu, não recebeu e jamais aceitou promessa de receber (são os três verbos do núcleo do tipo penal do crime de corrupção passiva; se quiser, depois eu lhe explico), num apartamento que nunca foi dele, no qual ele jamais pernoitou por uma noite sequer - nem ele, nem a esposa, nem qualquer dos filhos, nem amigos, parente algum, nem assessor, nem inquilino. Um apartamento que não era, nunca foi, não será e jamais seria dele (e com o sítio a história foi basicamente a mesma). Nem dele, nem de qualquer "laranja" que ele pudesse ter indicado. Um apartamento triplex, num prédio merreca de classe média, com 70m2 em cada pavimento, sendo que o superior é o "telhado" do edifício, onde há uma pequena banheira a que chamam de "piscina" e um singelo equipamento para churrasco. Só! Não vou entrar em detalhes técnicos a respeito das aberrações jurídicas cometidas pelo juiz corrupto que vendeu essa sentença em troca do cargo de ministro da justiça e promessa de galgar ao STF - sou profissional do direito há trinta anos, li o processo inteiro, sei o que digo e já me cansei de escrever a respeito.

Não tem roubo algum e me espanta que você acredite mesmo que Lula seja um corrupto se, tendo governado o país por oito anos - ou seja, tendo administrado orçamentos que somaram mais de dez trilhões de reais - ele, o "chefe da quadrilha", saísse do "maior caso de corrupção" das galáxias com duas reforminhas em propriedades que não foram e jamais seriam dele... Se essa sua "convicção" não for fanatismo antilulista, me explique o que é, então.

Bem, aí veio a pandemia. Chegou ao Brasil quando Lula estava na Europa. Ele voltou em 12 de março. Fechou-se com a namorada em seu apartamento, em São Bernardo. Está lá, de quarentena, cumprindo o isolamento social. Desde então, já concedeu - e fez! - dezenas de entrevistas. Em todas elas - rigorosamente em todas, sou testemunha - ele se solidarizou com os familiares dos mortos, expressou seus sentimentos e sua indignação com a falta de rumos de um país que, em plena pandemia, se dá ao luxo de não ter um ministro da saúde no comando das ações. Nem ministro, nem presidente.

Na somatória geral das entrevistas, Lula deve ter usado algumas dezenas de milhares de palavras de conforto, de consolo, de esperança, de carinho com as vítimas desse inimigo invisível e perigoso que é o Covid-19 - como se já não bastasse o "Bovid-17", o "bolsonarismo", esse fascismo à brasileira que tanto mal vem fazendo ao país desde antes da ascensão do próprio BolsoNero.

Em meio a essas dezenas de milhares de palavras - todas elas rigorosamente ignoradas pela mídia comercial que atende pelos nomes de TV Globo, GloboNews, outras emissoras e jornais -, eis que essa mídia velha, cruel e injusta, conseguiu caçar, como num gigantesco jogo de caça-palavras, duas palavrinhas, "ainda bem", empregadas por Lula ao dissertar sobre a importância do SUS e da presença do Estado neste trágico momento da pandemia, e fez delas um escândalo.

Num momento em que todas as pessoas que raciocinam neste país e no planeta Terra se questionam sobre o destino da Humanidade no período que se iniciará após a pandemia, se sairemos dela mais humanos, mais solidários, ou se tudo voltará ao canibalismo egoístico de antes, Lula pontuava sobre a importância do Estado para implementar políticas públicas que promovam a igualdade, a justiça social. Nesse contexto, o exemplo do SUS, fundamental para o atendimento universal da população. Do mais desafortunado ao bilionário, todos, brasileiros ou estrangeiros aqui residentes, têm direito de recorrer ao sistema único de saúde, que tem lá seus defeitos, que enfrenta dificuldades históricas, mas que é um exemplo para o mundo todo. "Ainda bem" que temos a oportunidade de enxergar a importância do SUS, da presença do Estado na vida do povo. Foi isso que Lula disse! Não "quis dizer", disse. Nem precisava, mas ele conseguiu dar mais uma demonstração de sua altivez, de sua condição de estadista, e pediu desculpas pelo escorregão que não cometeu.

Achar que Lula estaria enaltecendo a desgraça do povo é ignorar todo a história de vida dele, que desde 1978 se confunde com a vida de todos os brasileiros.

Aí vejo você, João, ou Joana, compartilhando uma "charge" em que num quadro BolsoNero aparece sobre uma pilha de cadáveres dizendo "e daí?" e, ao lado, outro, semelhante, em que Lula diz "ainda bem". Não dá, bicho.

As duas palavrinhas que queria lhe dizer são exatamente essas: "ainda bem".

Ainda bem, meu caro, minha cara, que você me deu a oportunidade de vislumbrar o fanático antilulista que se esconde por trás dessa sua carinha pretensamente inteligente. Cansei, não tenho mais "saco" para fanatismo como esse seu. Adeus.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 21 de maio de 2020).

12/05/2020

Governo contra o Brasil

É um governo negativo. Um não governo.

Não tem ministros "de", mas "contra". Ministro"contra" o Meio Ambiente, Ministro "contra" a Educação, Ministra "contra" os Direitos Humanos...

Um presidente contra seu próprio povo. Um Presidente "contra" a República.

12 de maio de 2020

07/03/2020

Chora Mais

Acabei de rever o premiadíssimo documentário "Democracia em Vertigem", que concorreu ao Oscar, e confesso que me emocionei mais do que da primeira vez.

Dele, Pedro Bial, o intelectual do BBB, disse tratar-se de uma "peça de ficção". Se eu não tivesse acompanhado tão de perto os fatos políticos retratados, se eu fosse um estrangeiro a quem de repente fosse apresentado o filme, eu tenderia a concordar com o jornalista global. Duvido, porém, que o melhor dos autores de ficção de toda a história da Humanidade, de Homero aos contemporâneos, passando por Shakespeare e suas peças sobre a intimidade do poder, tivesse criatividade suficiente para elaborar um roteiro tão surreal como os recentes acontecimentos que vitimaram a democracia brasileira.

Estou no PT desde antes de sua criação, desde que li, numa entrevista à Folha de São Paulo em 1979 - eu, então com dezesseis anos, trabalhava num jornal de minha cidade - que o líder sindical que sacudia o Brasil e abalava a ditadura militar havia constatado que era insuficiente a classe trabalhadora se organizar para atender apenas os interesses de cada categoria profissional. Dizia Lula que era necessário pensar num partido político que efetivamente representasse a classe trabalhadora, pois só a tomada do poder seria capaz de implementar políticas em favor de todos, inclusive dos cidadãos desorganizados e alijados das relações econômicas. Sinto-me, portanto, corresponsável pela construção do sonho de um partido oriundo das camadas populares chegar ao poder - e isso independentemente de ter sido vereador por dois mandatos e dirigente partidário até hoje.

Já é quase uma obra de ficção a realização do sonho de tornar um homem do povo presidente da República de um país tão marcado por preconceitos. Reelegê-lo, então, parecia algo impossível, tanto quanto eleger duas vezes a primeira mulher a exercer o cargo - logo ela, que, acusada de terrorista na juventude, encarou com altivez os militares. Emblemática a foto dos seus inquisidores escondendo o rosto, enquanto a perigosa menina franzina mantém a cabeça erguida, destacada no documentário.

Ficcionais, igualmente, parecem os fatos que marcaram o golpe dos corruptos de 2016, como o vazamento de uma conversa entre senadores da República em que um deles afirmava que, para "estancar a sangria" das investigações de corrupção que Dilma Rousseff se recusava a interromper, o melhor a fazer era colocar o vice Michel Temer em seu lugar, "num grande acordo nacional, com supremo, com tudo". Que autor seria capaz de entabolar um tal diálogo com tanta criatividade? Basta ver que o renomado cineasta brasileiro José Padilha, a despeito da obra construída pela realidade, não foi capaz de compreendê-la e, na série "O Mecanismo", da Netflix, cometeu a desonestidade histórica de por essa frase, "com supremo com tudo", na boca de Lula! (Agora ele anuncia que dirigirá uma série baseada em Marielle Franco e eu temo que ele conclua que quem mandou matá-la foi Lula!).

Quer espetáculo mais surreal do que a vergonhosa votação da autorização para a abertura do processo de impeachment pela Câmara Federal? Aquela do "voto sim pela minha família, por Deus e pelo meu cachorrinho".

Tudo isso está friamente retratado no documentário de Petra Costa e é mesmo difícil acreditar que toda aquela sucessão de horrores tenha acontecido na vida real. "Uma obra de ficção", diz o jornalista da Globo que se acostumou a viver a realidade retratada no "reality show" que ele apresentou por anos a fio, sobretudo porque é sua obrigação funcional defender os seus patrões, os donos da emissora que "Democracia em Vertigem" desnuda como participe ativo do golpe. Aceitar a realidade - a realidade real - não deve estar sendo fácil a essa gente.

O documentário passa pelo desmonte da economia nacional pela Lava Jato - com destaque para o corajoso enfrentamento de Lula com Sérgio Moro, por ocasião do célebre interrogatório em Curitiba - e se encerra com a eleição bizarra de um sujeito bizarro, esse que se recusa a governar e demonstra maior aptidão ao papel de palhaço. Que só venceu a eleição graças a uma facada ainda muito mal explicada - a mim não convence a encenação - que causou comoção nacional, "humanizando" o apologista da tortura, e o retirou de qualquer debate em que suas "ideias" pudessem ser confrontadas com as de Fernando Haddad, isso tudo coroado com uma avalanche de "fake news" financiada via caixa dois por empresários igualmente apalhaçados, como o inacreditável Luciano Hang da Hawan. Ou seja, o PT só perdeu a eleição, que seria sua quinta vitória consecutiva, graças a um novo golpe, necessário para garantir o anterior, entremeados um e outro pela farsa da prisão e silenciamento de Lula, que teria vencido o pleito mesmo encarcerado.

O que mais dizem os repetidores do "mito" é que o PT não soube perder, seguido da frase surrada que dá título a esta crônica.

Hoje chorei revendo o documentário. Chorei, não por mim, que tenho a vida feita, que me proporciona um bom conforto, independentemente de quem esteja no poder. Chorei pelas famílias que foram desligadas ou estão na fila do bolsa-família. Chorei pelos que hoje estão desempregados e pelos que perderam o alento e já nem mais são computados nos índices de desemprego.

Chorei pelo fim do programa Minha Casa Minha Vida, pelos que tiveram que se mudar para as ruas e pelos que foram obrigados a voltar aos semáforos e às portas de igreja para pedir esmolas - tenho me deparado com essa situação até mesmo dentro de shoppings, supermercados e restaurantes.

Choro, sim, por você que pensa que debocha de mim mandando-me chorar mais. Choro por sua incapacidade de compreender a realidade em que você próprio está metido, choro pela ignorância hoje alçada a requisito para governar o país e adotada como base para políticas públicas de educação por quem sinceramente acredita que livros didáticos são "um monte de coisas escritas". Choro pela morte de programas de pesquisa científica, pelo fim do "Ciência sem Fronteira", dos programas de facilitação do acesso à universidade, pública e privada, pelo desmonte do ensino público.

Choro por ver o palhaço do Planalto assumindo cada vez mais essa condição, sob aplauso de um nada respeitável público que com ele se identifica, pelo caráter autoritário, truculento, pela sua ignorância orgulhosa e arrogante, pela sua incompetência, por sua confessada inaptidão para governar.

Choro por ver a cultura deste país, como mencionado por quem outrora foi a "namoradinha do Brasil" e hoje se diz "casada" com o presidente de pendores fascistas, reduzida ao pum de talco que sai da bunda do palhaço. Palhaço, no caso, que a nomeou para o cargo.

Eu choro, choro sim, enquanto você ri dessa palhaçada toda.

Ria, ria mais!

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, aos 7 de março de 2020)

16/02/2020

Católicos Enfurecidos

A visita do ex-presidente Lula ao Papa Francisco não foi nada "simples, breve e protocolar", como algumas lideranças católicas têm insistido em dizer.

Lula não é mais presidente, não é chefe de Estado, é apenas um ex-governante, e foi recebido exatamente pela importância que tem como liderança mundial na luta contra a fome e em favor dos pobres e da paz.

O evento ocorreu no contexto da preparação do encontro de Assis (cidade italiana, berço de São Francisco) sobre economia, uma iniciativa do próprio Papa, um declarado adversário do capitalismo, da cruel exploração do homem pelo homem, que gera desigualdades e injustiça social.

Francisco não é o bobinho desavisado e descuidado que essas lideranças católicas tentam fazer crer que seja. O Papa é um chefe de Estado muito bem informado e, como tal, e também por sua experiência pessoal, sabe do que acontece na América Latina, na sua Argentina, no Brasil, no Peru, no Equador, no Chile, na Bolívia. Sabe do lawfare, da guerra híbrida que os Estados Unidos travam mundo afora na defesa de seus interesses econômicos e geopolíticos, sobretudo o interesse pelo petróleo (nosso pré-sal já foi e a maioria dos brasileiros nem se deu conta de que fomos vítimas de um saqueamento promovido pela nação vitoriosa, como sói acontecer nos conflitos bélicos tradicionais).

Francisco tem em Lula, portanto, um importante aliado, e isso porque ele sabe do imenso respeito de que o ex-presidente brasileiro goza perante a comunidade internacional.

As tais lideranças católicas a que me refiro tratam Lula como se fosse um simples candidato em busca de uma foto impactante para ser usada em campanha eleitoral, o que está longe de ser verdade. Lula, hoje, é considerado pela justiça eleitoral brasileira inelegível (contrariando a Constituição e descumprindo determinação da ONU). O ex-presidente tem consciência dessa condição e não é candidato a nada.

O que fazem as tais lideranças é tentar acalmar o espírito encapetado dos seus fiéis, tomados pelo ódio e inconformados com a atitude absolutamente consciente da autoridade máxima de sua igreja, para não os perder, para não os ver tomarem o rumo de uma seita obscurantista e fundamentalista qualquer. Apenas isso.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 16 de fevereiro de 2020)

26/01/2020

Coerência

Lamento pelos ex-companheiros que por um olhar apressado sobre os acontecimentos politicos não souberam compreender os interesses em jogo, que não mantiveram a coerência e a firmeza esperadas e se deixaram abater pela onda de mentiras que vem assolando o Brasil desde o inverossímil "mensalão".

Fico triste quando vejo pessoas que outrora estiveram comigo, ombro a ombro, panfletando de casa em casa, na construção de um partido de raízes populares e prática democrática e na preparação para que quando este chegasse ao poder representasse, de fato, os interesses da classe trabalhadora e dos mais necessitados, que desse atenção aos eternos esquecidos por aqueles que nos governaram por quinhentos anos, e que, depois do objetivo alcançado, renegaram a luta e a própria maneira de pensar. E que se permitiram abater por uma evidente e cruel campanha de adversários políticos e inimigos na histórica luta de classes que culminou no golpe dos corruptos de 16.

Acabo de ver uma publicação já antiga de uma pessoa com esse perfil, em que ela compartilhava a notícia de então sobre o "power point" de Deltan Dallagnol em que este apontava, falsamente, Lula como chefe de um esquema de corrupção. "A casa caiu de verdade", consta da publicação.

A casa da verdade foi que desmoronou.

Hoje sabemos quem são os verdadeiros criminosos, quem fez de um enganoso combate à corrupção um meio de ganhar holofotes e rios de dinheiro com palestras, em pleno exercício de cargos públicos, quando não na forma de promessas (parcialmente já cumpridas) de cargos como o de ministro da justiça hoje e do STF amanhã.

De fato, a casa caiu mesmo, e foi a partir das revelações do site The Intercept Brasil, do jornalista Glenn Greenwald, que trouxeram a público as verdadeiras intenções da organização criminosa que se formou em Curitiba em torno da grife Lava Jato. As pessoas a quem me refiro, no entanto, parecem ter optado por fechar os olhos. A impressão que me resta é a de que escolheram não acreditar, preferiram se deixar enganar pela narrativa construída pela mídia tradicional.

Compreendo as limitações humanas. Sei que nem todos têm a mesma capacidade de discernimento e de percepção, a mesma fibra e igual firmeza. Sou, porém, dos que acreditam no ser humano, na sua capacidade de refletir, de separar o joio do trigo, de recuperar a coerência e de ter a dignidade e a humildade de reconhecer a verdade.

Gostaria imensamente de ver de volta os valorosos companheiros que, levados pela onda sem resistir, sucumbiram ao massacre diuturno e sem trégua da mídia burguesa e das facções do Estado a serviço dos poderosos, como partes podres da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário. Estou, aliás, estamos dispostos a recebê-los de braços abertos.

A luta há de continuar!

(Luís Antônio Albiero, em Capivari-SP, 26 de janeiro de 2020).

10/01/2020

Serventia da Casa

Vi o especial de Natal do Porta dos Fundos, "A Primeira Tentação de Cristo".

Para quem não nutre preconceitos nem está atrelado a dogmas religiosos vale a pena assistir, mas não se espere grande coisa. É mais do mesmo do que a companhia de comediantes põe à disposição dos internautas todo dia no YouTube. Engraçadinho, apenas.

O mais interessante é que a preocupação mais destacada dos cristãos ao atacar o filme concentrou-se na suposta homossexualidade de Jesus (que, na verdade, não passa de uma "tentação" do Tinhoso ao Cristo - perdoe-me o leitor pelo "spoiler" - que poderia até ser classificada como uma visão homofóbica do grupo humorístico, já que associa o homossexual ao mal, exatamente como fazem os fundamentalistas religiosos).

Do ponto de vista da religiosidade, porém, há aspectos mais graves, como uma representação de Deus - divindade máxima do cristianismo - que não contém seus ímpetos machistas e pratica assédio sexual contra uma mulher, outra figura sagrada do catolicismo, que pouca resistência oferece.

Ou seja, as pessoas críticas ao filme não parecem preocupadas com a sexualidade machista e opressora contra a mulher, mas destacadamente com a homossexualidade.

É apenas um filme, enfim, e a ele assiste quem quer. Quem não quer, que lhe feche as portas. Da rua ou dos fundos, elas continuam sendo serventia da casa.

O que não se pode aceitar é que um desembargador "terrivelmente cristão", de olho numa vaga do STF nesta "triste era Bolsonaro" (como diz o jornalista Joaquim de Carvalho, do DCM), rasgue mais um pouco a já esfarrapada Constituição Federal e decrete censura a uma obra de pura ficção humorística.

Aliás, como já havia acontecido em 1983 com o francês "Je Vous Salue Marie" (de Jean Luc Goddard) - muito ruim, por sinal -, a investida dos religiosos só serviu para despertar o interesse e alavancar a audiência do filme.

(Luís Antônio Albiero, Capivari, SP, em 10/01/2020)

23/11/2019

Vácuo Preenchido

Lula passou 580 dias preso na masmorra política de Curitiba e nesse extenso lapso temporal - um ano e meio! - não despontou nenhuma alma brasileira com disposição e legitimidade para liderar a oposição a BolsoNero.

Cá entre nós petistas, nem Fernando Haddad conseguiu se firmar nessa posição, como esperávamos, muito menos Ciro Gomes, que passou esse tempo todo tentando, isso sim, consagrar-se como líder antipetista e fazendo acenos e constrangedores afagos ao governo BolsoNero.

Foi Lula sair da prisão política para sua liderança aflorar natural e imediatamente. Nem a mídia elitista, que durante todo o período de confinamento condenou o ex-presidente ao ostracismo, está conseguindo ignorar o grande comandante da oposição que ressurgiu com sangue nos olhos.

E ressurgiu colocando os pingos nos is sobre a lenga-lenga da "autocrítica do PT" e reconhecendo a polarização como necessária no processo político.

Candidato ou não, Lula está em campo nesse jogo histórico entre a civilização, representada por ele e por todos aqueles que reconhecem a Política como atividade humana necessária para a paz social e a Democracia como seu melhor regime, e, no polo oposto, a barbárie representada por BolsoNero, seu clã, seu multifacetário ministério e seu amplo suporte miliciano - compreendendo as milícias propriamente ditas, armadas e sediadas no Rio de Janeiro, e as virtuais, que incluem robôs e uma rede de odientos que se prestam ao papel de massa de manobra do bolsonarismo.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 23 de novembro de 2019)

11/11/2019

Livre, Leve e Solto

Agora, essa!

Algum peão tocador de berrante soprou que "Lula está solto, mas não está livre" e essa praga se espalhou mais que carrapato em meio ao gado, mais contagiosa que o mal da vaca louca, que compromete o cérebro dos animais.

O desapreço que essa gente tem por um simples dicionário é inacreditável. Bastava folhear um, e eu juro que não é difícil procurar palavras pela ordem alfabética. É uma questão de hábito.

Lula está livre, sim. Livre, leve e solto!

Ele está tão livre quanto eu e você, que acreditou nessa patacoada.

Sabe por quê? Porque ele, eu e você somos inocentes, não somos culpados de nada, porque não há sentença condenatória transitada em julgado contra nenhum nós (bom, falo por mim e por Lula, pois, quanto a você, nada sei sobre sua folha corrida; quanto a mim, nem sentença, nem processo algum há).

Se você me perguntar se hoje ele está "livre para ser candidato", eu sou obrigado a reconhecer que não, por força de uma interpretação anômala que o TSE deu à Constituição Federal, mas isso é outra coisa. Estar "livre para" é diferente de estar em pleno gozo da liberdade de ir e vir.

Se você é casado e se considera plenamente "livre", eu lhe pergunto: você está "livre para" casar? Não, neste momento não, a menos que queira cometer bigamia. Você está "livre para", sozinho, vender integralmente um imóvel que seja de sua propriedade e de seu cônjuge? Não, porque a lei o impede, como impede Lula de ser candidato. Mas nem você, nem ele podem deixar de ser qualificados como "livres".

Você, como eu, como Lula, está livre para ir ao Nordeste, à Argentina, ao Japão e até à lua, se tiver como ir. Livre para ir e livre para voltar.

Antes de sair por aí repetindo o que lhe vem pelo berrante errante, vá ler um dicionário, primeiro. Depois, leia a Constituição e, se não for exigir muito de você, leia na sequência um singelo livrinho de Direito.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 11/11/2019)

10/11/2019

Polidez e Persuasão

Talvez eu seja ingênuo, mas ainda acredito na civilização. Por isso opto, sempre que possível, pela polidez no relacionamento com as pessoas.

Nessa atmosfera de ódio que nos cerca, muitas pessoas a quem acreditávamos conhecer se revelaram radicalmente diferentes do que nos pareciam.

O princípio desse fenômeno perdeu-se no retrovisor e é muito simplista identificá-lo com o advento das redes sociais, embora estas o tenham amplificado, mas o fato é que se desencadeou, ao longo do tempo e de maneira pouco perceptível, um movimento multitudinário que encorajou as pessoas a extravasarem seus instintos primitivos, pré-civilizatórios, pré-históricos. Agigantou-se assim o ódio ao outro. Passou-se a ver o que pensa diferente como um inimigo a ser descartado, excluído do grupo, se possível aniquilado.

A seguir nesse ritmo, o que se avizinha são combates sangrentos, não a guerra tradicional de uma nação contra outra, mas enfrentamentos mortais entre nacionais, entre concidadãos, entre pessoas que habitam sob um mesmo teto. É o fascismo em sua roupagem de gala.

Porém, assim como a Humanidade, ao longo da História, evoluiu da barbárie à civilização - e evoluiu especialmente pelo desenvolvimento da Política (pólis; polidez) e do Direito -, eu ainda acredito numa breve regeneração desses raivosos e odientos contemporâneos.

Penso que o que nos cabe fazer, como seres amantes da Humanidade e de seus avanços civilizatórios, é resgatar a principal característica da Política desde que os gregos a inventaram: a persuasão. E a única forma de persuadir as pessoas é por meio das palavras, apelando à racionalidade, o que exige tratamento civilizado nos diálogos.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 10/11/2019)

09/11/2019

Analfabetismo Social

Essa história do "Lula analfabeto" só revela o analfabetismo social das pessoas que assim o consideram.

Vou confessar uma coisa. Eu li muito em minha vida - de anúncio de jornal a densos romances de Dostoiévski -, mas estou com inveja de Lula, que nesses 580 dias já deve ter lido mais do que eu em toda a minha vida!

Por exemplo, ainda não consegui ler Mia Couto, escritor moçambicano, ou o cubano Leonardo Padura, que Lula já leu!

E leu mesmo, conforme testemunhou, no que lhe diz respeito, o escritor Lira Neto, com quem Lula discutiu passagens da biografia de Getúlio Vargas, de sua autoria.

Durante o discurso de hoje, no sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, ele fez referência a ter feito um curso de economia. Não, não é faculdade de economia, mas um curso que lhe foi ministrado por economistas do mais alto calibre, como Maria da Conceição Tavares, Aluísio Mercadante, Luciano Coutinho e outros.

Antes de se tornar presidente, ele aprendeu muito com grandes intelectuais brasileiros, como Francisco Weffort, Florestan Fernandes, Márcio Pocchmam e tantos outros.

Lula não é fruto do acaso, não. Lula é fruto de seu próprio esforço e dos que o auxiliaram nessa caminhada, há muito tempo vitoriosa.

Eu tenho pena dessas pessoas que, cegas pelo preconceito, perturbadas pelo ódio, não sabem apreciar o momento raro e o privilégio irrepetível de poder conviver, ao vivo, em cores, de carne e osso, com alguém que pelos séculos e séculos amém será considerado uma pessoa mítica.

(Luís Antônio Albiero, 9/11/2019, em São José dos Campos)

O Espetáculo de Lula

Moro quis humilhar Lula ao prendê-lo, em abril de 2018, mas o ex-presidente soube dar as cartas e comandou o espetáculo da sua própria prisão, para a qual caminhou altivo levando consigo o imenso carinho do povo que, em vigília no sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo, tentava de todo modo impedir o infortúnio.

Agora - desta vez Dallagnol e seus comparsas da OrCrim da Lava Jato -, quiseram novamente humilhá-lo, tentando forçá-lo a deixar a prisão para passar para o regime semiaberto, carregando uma culpa que Lula sabe que não tem.

Lula recusou a "oferta", teve a paciência de esperar e, mais uma vez, gerenciou o espetáculo da sua libertação. De novo, nos braços do povo e retornando ao mesmo sindicato de São Bernardo.

É por isso que tantos o temem.

(Luís Antônio Albiero, em São José dos Campos, 9/11/2019)

21/10/2019

No Japão

Brasileiro caminhando pelas ruas de Tokyo pergunta a uma adolescente japonesa:

- Oi! Você sabe quem sou eu?

Ela:

- Hmmmmm... Não!

Ele:

- Vou lhe dar um dica!

Ela:

- Arrã...

Ele:

- Sou presidente do Brasil, talquei!

Ela:

- Lula!?! Mas você tirou aquela barba charmosa?!?

07/09/2019

Pelo Voto e Sobre a Lei

Vivemos uma ditadura que se implementou pelo voto popular e vai se sustentando sobre a letra fria da lei.

O presidente do TJ do Rio de Janeiro anulou a liminar de um juiz que suspendia a decisão arbitrária do prefeito Marcelo Crivella que determinava a apreensão de livros com "conteúdo impróprio", expostos na Bienal do Livro.

A decisão do desembargador baseou-se no estatuto da criança e do adolescente (ECA), que em dado artigo prevê que “as revistas e publicações destinadas ao público infantojuvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família”.

O que não falta por este Brasil adentro são publicações com ilustrações de "armas e munições", por exemplo, a começar de jogos de "vídeo game", filmes na TV e discursos do presidente da república, mas com isso ninguém se importa. O que importa é que não haja beijo gay.

É interessante constatar que o beijo gay escandaliza, mas o beijo hétero, esse não. E o estatuto (ECA) não diferencia um do outro.

Noves fora, o que escandaliza é a homossexualidade, um problema que reside exclusivamente no departamento do preconceito que cada um guarda dentro de si, uns com mais zelo do que outros.

Ocorre que o ECA também não faz menção à homossexualidade.

Então, onde está o erro jurídico do desembargador presidente do TJ/RJ?

Está na compreensão do que sejam "valores éticos e sociais da pessoa e da família".

Ele simplesmente desconhece - porque seu compartimento de preconceito o impede de ver - que haja pessoas e famílias com características diferenciadas da pessoa e da família dele próprio.

O erro, portanto, não está no estatuto, na lei, mas na consciência equivocada e na visão retrógrada dos que têm o dever de aplicá-la e de fazê-la cumprir.

(Luís Antônio Albiero, de Capivari-SP, em 7 de setembro de 2019)

20/06/2019

O CPCu do Marreco

Doutor Frank me pediu que fosse ao gabinete do doutor Helene buscar o CPP, por empréstimo. Era o início dos anos 80 e não havia computadores, tablets, celulares. A fonte do Direito vinha mesmo em volumes pesados de papel e capa dura que reuniam leis, comentários, jurisprudência. Lá fui eu à sala do juiz da segunda vara criminal de Piracicaba buscar a fonte do direito processual penal para o outro magistrado, da primeira, de quem eu era escrevente de audiências.

Doutor Helene, hoje desembargador (imagino que aposentado), tinha fama de ser rude com os serventuários, o que me deixou com maus pressentimentos. Adentrei à sala, estavam apenas ele e Rosângela, a escrevente. Ele ditava qualquer coisa à minha colega e eu aguardei em pé, à porta. Quando terminou, ele, com ar grave adequado à fama, atirou em minha direção seus tremebundos olhões enormes, sob os quais cultivava fartos fios de bigode, tudo adornado por uma vasta cabeleira e vistosas correntes e pulseiras. Anunciei, com voz claudicante: “vim buscar o CPP, a pedido do doutor Frank”. Ele então esticou-se todo na cadeira, bufou, cerrou o cenho e me perguntou: “o que é CPP?”

Partindo tal pergunta de um juiz, eu só poderia concluir que ele estava brincando comigo. “Código de Processo Penal”, respondi candidamente, mas com uma nesga de preocupação. E ele: “quanta intimidade o senhor tem com o código, hein! CPP é para os íntimos!” O juiz malvado, no fundo, era mesmo um brincalhão. Ri, agradeci e saí.

As leis no Brasil, especialmente os códigos, são conhecidas assim, por apelidos. CF é a Constituição Federal; CLT é a Consolidação das Leis do Trabalho; ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente. A antiga LICC – lei de introdução ao Código Civil – agora é LINDB – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – à qual chamo, na intimidade, de “Lindbergh”. De fato, as siglas proporcionam uma certa aproximação íntima com o objeto.

As leis federais, sabemos, têm valor nacional, ou seja, valem por todo o território brasileiro, podendo alcançar até mesmo, conforme o caso e a pessoa, espaços no estrangeiro, como navios e aeronaves. Mas há uma gleba no Brasil em que as leis federais e a própria Constituição parecem não valer. Refiro-me a Curitiba.

Ali desenvolveu-se um ramo próprio do Direito, em que é normal um juiz conversar com procuradores da República para traçar estratégias de atuação dos acusadores contra determinado réu. Não vou mencionar o nome de um réu em especial, para não passar a impressão de que o direito curitibano tenha por destinatário uma única pessoa, nem insinuar que naquela próspera comuna paranaense não se respeite o princípio da impessoalidade.

Lá na zona franca de Curitiba a lei permite, por exemplo, condução coercitiva ainda que o conduzido sequer tenha sido previamente intimado a depor. Lá é possível que um juiz intercepte (ops!) uma ligação telefônica entre uma presidenta da República e seu colega ex-presidente. Lá é normal que o mesmo juiz encaminhe a conversa não ao Supremo Tribunal Federal – que, ao que parece, abriu mão de sua jurisdição sobre as plagas curitibanas –, mas à Rede Globo de Televisão.

Estou me referindo ao Código Penal de Curitiba, que, para não confundir com o nosso bom e rejuvenescido Código de Processo Civil (CPC), resolvi apelidar de CPCu. Na intimidade, por óbvias razões abjetas, eu pronuncio "cepecu".

De acordo com o CP-Cu, é absolutamente normal que o juiz estabeleça contato com um procurador por meio de um aplicativo de rede social e, pedindo sigilo, passe-lhe orientações sobre como uma de suas colegas deva se comportar em audiência. Aliás, até mesmo que esse procurador recomende ao chefe do bando – ops! –, digo, da força-tarefa, que a moça não esteja presente quando o réu, aquele determinado a quem não me referi, for ouvido em depoimento.

Como escrevente do saudoso doutor Frank, falecido no cargo de desembargador, muitas vezes presenciei seus diálogos com promotores e advogados. Nunca o vi sugerir a uns ou outros como devessem agir em determinados casos. Quando alguém se metia a pedir isto ou aquilo em relação a um processo, o juiz nascido em Itapetininga, onde houvera exercido dois mandatos de vereador antes de ingressar na magistratura, dizia-lhes simplesmente: “peticione, que eu respondo nos autos”.

Já o jurista natural de Maringá, cujo notório saber figadal concebeu o CP-Cu, abandonou a magistratura, assumiu seu lado político e hoje responde pelo Ministério da Justiça do Brasil. Chegou a tentar emplacar parte de sua genuína obra em todo o país, por meio das tais “dez medidas”, formalmente propostas por seus dallagnoizinhos a quem servia de “coach”, mas hoje parece renegá-la em parte. Cito como exemplo aquela parte em que a “orcrim” (adoro siglas) dos malandros federais tentava tornar normal em todo o Brasil, como já era prática corrente na capital paranaense, a utilização de prova obtida por meio ilícito – se bem que, por aquelas bandas, por vezes ocorre de prova alguma ser necessária.

O marreco autor do CP-Cu agora deu de grasnar que os diálogos por ele travados na escuridão das redes sociais com os procuradores, trazidos à luz pelo site The Intercept Brasil, foram obtidos por meios ilícitos e que, por isso, esse tipo de expediente não tem valor legal. Ou seja, ele acabou de reformular seu CP-Cu, de modo que sensacionalismo e vazamento já não são mais normais.

(Luís Antônio Albiero, 55, procurador municipal e ex-vereador de Capivari-SP pelo Partido dos Trabalhadores)