O que mais me tem espantado, a par da insensibilidade e do grau de ignorância sobre a História do país e do mundo, é a sem-cerimônia com que esses infonavegantes lidam com o interlocutor – ou seja, comigo, com o apertador de teclinhas que está do lado de cá do aparelho.
O respeito é zero. O sujeito que está do outro lado não me conhece, não faz ideia de quem eu seja, nunca me viu, nunca trocou uma só palavra antes comigo, mas já se sente no direito de extrair um milhão de conclusões sobre o meu caráter. Eu, o sujeito que está do lado de cá, sou agraciado com diversos qualificativos, ou desqualificativos, muitos dos quais fariam corar porteiro de casa de tolerância. De “burro” a “ladrão” – os mais singelos –, os designativos variam ao gosto do freguês, mas o que mais me desperta a atenção é quando me chamam de “velho”.
É evidente que basta uma breve pesquisa no meu perfil para o sujeito saber qual a minha idade e avaliar a minha imagem, que aparece no meu “avatar”. Não creio que meus 54 anos e essa minha carinha de dezoito emoldurada por grisalha cabeleira sejam suficientes para me caracterizar como “velho”, se é que alguém, qualquer que seja a faixa etária, há de merecer ser tratado como tal, ainda mais em tom evidente de xingamento. Não demora, o nada refinado internauta solta uma pérola, um juízo qualquer sobre política ou realidade social, o que me dá ensejo de lhe dizer “meu caro, quando você crescer em idade e em conhecimento certamente terá vergonha do que acabou de escrever".
Em geral, são jovens, de ambos os sexos, com inegável propensão ao fascismo que não se pejam de passar vexame nas redes sociais, expondo a nudez peluda de seu espírito carregado de ódio e preconceito, do tipo que aplaude um ogro mentecapto que afirma que o melhor caminho para enfrentar a violência é “metralhar a Rocinha” e que se julga no direito de decretar quais mulheres têm o “direito” de ser estupradas, conforme a beleza física de cada uma.
São meninos e meninas que mal ouviram falar dos anos de chumbo da ditadura militar e que não viveram as dificuldades econômicas que o país atravessou logo após a redemocratização. Garotos e garotas que passaram a infância e a juventude metralhando e matando inimigos virtuais em joguinhos de “videogames”, o que deve ter contribuído para lhes passar a falsa impressão de que a vida humana tenha o mesmo valor das “vidas” dos personagens fictícios que se acostumaram a eliminar e de que há um “chefão” a ser destruído no final do jogo.
Não sou psicólogo, não ambiciono dar qualquer peso técnico à avaliação que acabo de fazer, mas é o que me ocorre a partir da observação do que tem ocorrido tanto na vida real quanto nas redes sociais, especialmente no contato direto com uma parcela dessa juventude, à qual se juntam, bobos alegres, os “tiozões” sem-noção de todas as idades.
Nestes sombrios tempos pelos quais estamos passando, temo que esse comportamento odiento, de desqualificação e eliminação do outro, tome corpo e venha a ser determinante no pleito eleitoral que se realizará em outubro. A democracia brasileira, recentemente falecida, não merece ser substituída – muito menos por meio do voto popular, suprema ironia – por um regime que já experimentamos e que julgávamos morto e enterrado, que se baseia na intolerância, na truculência e na destruição de quem ouse pensar diferente.
Alguém precisa dizer a esses jovens que só há uma alternativa à velhice. Torço para que todos eles possam experimentar o prazer e o privilégio de envelhecer.
(Luís Antônio Albiero, advogado, vereador em Capivari pelo PT em 1989/92 e 2001/04).
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