Dono de quase 10% das intenções de voto, segundo pesquisas recentes de diversos institutos, Barbosa figurava em terceiro ou quarto lugares, no mesmo patamar de Marina Silva, abaixo de Lula – que segue liderando com folga, a despeito da incômoda situação de preso político – e Bolsonaro.
Barbosa notabilizou-se quando atuou como relator do caso Mensalão, sobretudo pela maneira truculenta e ditatorial com que desenvolveu seu trabalho, aí incluído até mesmo o modo de relacionamento pessoal com seus próprios pares. Não foram poucos os episódios em que se altercou ao vivo com outros ministros, em geral com uma grosseria que, em plena sessão da tarde, exigia tirar as crianças da frente da TV.
Esse não foi o seu pior, porém. Se “dar o melhor de si” é conselho repetido por cem de cada cem palestrantes motivacionais ou autores de livros de autoajuda, a máxima de Barbosa foi oposta. Ele se desdobrou para dar o pior de si, e conseguiu.
Foi ele quem deu início à onda de atropelos, em processos judiciais, aos direitos e garantias individuais consagrados pela Constituição Federal, de modo a seguir o "script" de criminalização da política e de perseguição implacável aos políticos que não interessavam ao “establishment”. Foi Barbosa que importou da Alemanha a malfadada “Teoria do Domínio do Fato”, publicada em 1963 pelo jurista alemão Claus Roxin, que a desenvolveu por ocasião do julgamento dos crimes cometidos por oficiais do partido nazista nos tribunais. Condenados como meros partícipes dos crimes contra a humanidade praticados contra judeus na época em que os nazistas estavam no poder, Roxin preocupava-se em demonstrar que eles eram autores dos fatos. “Achava que quem ocupa posição dentro de um chamado aparato organizado de poder e dá o comando para que se execute um delito tem de responder como autor e não só como partícipe”, disse o próprio jurista à Folha de São Paulo em 2014. Na mesma ocasião, frisou que “a posição hierárquica não fundamenta o domínio do fato” e que “o mero 'ter que saber' não basta”. Posteriormente, Roxin esclareceu que sua teoria não dispensa a existência de provas.
Usando de modo enviesado a teoria alemã, Joaquim Barbosa condenou José Dirceu sem qualquer prova de participação nos crimes, tendo-se contentado com o simples fato de que se tratava do ministro chefe da Casa Civil à época. Começou assim a mais grave e violenta sequência de agressões aos direitos constitucionais, no âmbito judicial, já vividos pelo país desde o regime militar.
Após anunciar sua desistência, Barbosa, que vive dizendo que foi eleitor de Lula e Dilma, mesmo durante o mensalão, e costuma acentuar as conquistas sociais de seus governos, afirmou que vê risco de um golpe militar no horizonte ou, ao menos, um golpe de Michel Temer para prolongar seu mandato. Ao fim, revelou que não votará em outubro, pois estará indo embora do país. Certamente vai curtir seu apartamento em Nova Iorque, que adquiriu de forma no mínimo suspeita, quanto à legalidade.
Muito oportunamente, Barbosa foi comparado pelo espirituoso jornalista Paulo Moreira Leite (do jornal eletrônico Brasil 247, que nesta semana me honrou com a publicação de um texto de minha autoria) ao protagonista do célebre filme brasileiro dos anos 60 – por sinal, censurado pela ditadura – que tem por título “Matou a Família e Foi ao Cinema”. O mais emblemático é que, nos anos 80, o filme teve um "remake" estrelado por ninguém menos, aliás, ninguém mais que Alexandre Frota, o protético “sex symbol” do Golpe dos Corruptos de 16. De fato, o ex-Batman do Supremo deu início ao assassínio em série dos direitos fundamentais dos brasileiros, matou a nação e agora vai tranquilamente curtir a aposentadoria nos Estados Unidos.
Outra baixa da semana na corrida presidencial foi a desistência do próprio presidente Michel Temer, outro notável “serial killer” dos direitos. Comandou a trama do “golpeachment” e seguiu pilotando a recente fase de aprofundamento do Golpe, em que se deu a morte do projeto de nação iniciado em 2003, projetado desde 1943 por Getúlio Vargas com a CLT e melhor delineado na Constituição de 88. Dono de ridículas intenções de voto nas pesquisas de opinião, Temer corria o risco de, considerada a margem de erro para menos, chegar em outubro com saldo negativo de votos. O presidente decorativo agora negocia uma aliança com Geraldo Alckmin, apostando em que, eleito, este lhe garantirá o foro privilegiado, nomeando-o para um cargo qualquer.
Temer é mais um que mata e, em seguida, quem sabe não vai também com Marcela e Michelzinho dar um pulinho na Disney.
(Luís Antônio Albiero, advogado, ex-vereador de Capivari pelo PT em 1989/92 e 2001/04)