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15/09/2023

Os "Manés" Chegaram ao Supremo

Errar é tão humano que até o irreprochável ministro Alexandre de Moraes permitiu-se cometer seus deslizes. Em abril de 2022, em palestra na FAAP, ele atribuiu ao jurista italiano Norberto Bobbio a frase “a internet deu voz a uma legião de imbecis”. Moraes, preparado como é, naturalmente leu incontáveis livros e, por isso mesmo, confundiu os autores. A frase é do escritor Umberto Eco. Ambos intelectuais italianos, foram contemporâneos e morreram neste século XXI - Bobbio, em 2004; Eco, em 2016. Pecadilho de venial tomo, portanto, que em nada deslustra a cabeça luminosa do supremo julgador, que até aqui acha-se em crédito perante a Nação, esbanjando saldo positivo. Tão elevado que, para zerar, teria que ele próprio cometer uma tentativa de golpe de Estado.

Um segundo deslize, quase imperceptível, deu-se quando trocou as letras "in" por "ni" ao mencionar "Antoine" e ao pronunciar "Anto_ni_ê" em lugar de "Antoan". Ocorreu em 14 de setembro, durante a segunda sessão de julgamento dos três primeiros "manés" acusados, e já condenados, pelos acontecimentos de 8 de janeiro.

Três "manés", como esperado, contrataram outros "manés" para defendê-los. A trinca de causídicos teve a coragem e conseguiu o feito de se expor ao ridículo em dimensão nacional. Se é para causar, vamos logo à tribuna do plenário do Supremo Tribunal Federal, devem ter conjecturado de si para si. E, de fato, a seu modo, foram bem-sucedidos. Atingiram o objetivo, lacraram e viralizaram nas redes.

O primeiro a fazer sustentação oral em defesa de um "patridiota" foi um ex-desembargador, logo um magistrado aposentado que, agora tendo sobre os ombros o peso da beca da advocacia, pôs de lado a ética da profissão, o estatuto da classe e a exigência dos códigos processuais que nos impõem, a todo causídico, portarmo-nos com urbanidade no trato com os demais colegas, juízes e partes do processo. Sentiu-se tão à vontade que, sem freios nem pejos, apontou o dedo para os ministros do STF e lançou-lhes nas fuças que, segundo vozes de sua própria cabeça, seriam eles as pessoas "mais odiadas" do país. No país dos terraplanogolpistas, sim, devem ser mesmo. Desde a ascensão de Sérgio Moro ao cargo de juiz federal uma pergunta tornou-se inevitável: como foi que esses jabutis chegaram ao cume do poste?

No dia seguinte, uma exemplar feminina dos ""manés"" de beca, mal saída dos bancos da faculdade, sentiu-se também muito confortável para fazer sua encenação. Esforçou-se para derramar lágrimas de crocodilo e, dizendo ter ódio à política, fez sua performance política. Não se pejou a expressar a vergonha que disse estar sentindo dos mesmos ministros, e, dos porões de seu saber jurídico, permitiu-se passar-lhes uma carraspana. Segundo disse, debitava a vergonha que deles sentia à conta dos critérios, que ela confessou não compreender, pelos quais os vexaminosos juízes estavam julgando seu cliente, mais um descuidado e ingênuo turista que tão somente havia aproveitado uma agradável tarde de domingo para fazer um passeio no parque dos poderes.

Outro "mané" bacharelado, ávido também por lacrar e criar imagem para suas campanhas eleitorais, acabou passando vergonha no débito, no crédito, no pix e sobre a tábua de passar roupa. Aluno exemplar da antiescola do bolsonarismo, o nobre causídico confundiu "O Príncipe", do filósofo Nicolau Maquiavel, com "O Pequeno Príncipe", do escritor e piloto de aeronaves Antoine de Saint-Exupéry. Uma confusão de quase quinhentos anos de distância entre uma e outra obras, entre um e outro autores - um, italiano; o outro, francês -, sem contar a diferença abissal entre as respectivas temáticas. O confuso rábula ordinário, já condenado pela justiça por conta de sua exemplar conduta de bater na própria mãe, acabou expulso pelo Solidariedade, partido ao qual pertencia. Pois é. Decidiu espancar também o Direito, a literatura e até a já combalida Pátria-mãe e acabou tendo que dar adeus à candidatura.

Todos os três sofreram dura, embora elegante, reprimenda dos integrantes da Corte e pelo menos o ex-desembargador terá de se ver com o tribunal de ética da OAB, que prontamente enviou um desagravo ao STF.

BolsoNero, quando no exercício da despresidência, certa feita encantou o gado que frequentava o cercadinho no entorno do Palácio ao criticar os livros didáticos. Disse que estes seriam "um monte de palavras escritas amontoadas". Daí a um bolsonarento lacrador confundir ciência política com jardim de infância, se fazia falta, não faz mais. Como disse o ministro, decerto um leitor dos clássicos, o advogado citou livro que não leu e contentou-se com os memes que passaram diante de seus olhos na sua "taimelaine". Como já dizia Platão em século passado, "não confieis nas feiquinius que rolam pela internet".

Desde que a imbecilidade, como afirmou com precisão o autor de "O Nome da Rosa", emergiu dos esgotos pelas infovias para ocupar, orgulhosa, o panteão do "celebritismo", todo pensamento elaborado com base na História, nas ciências, nos dados da realidade, no conhecimento acumulado por toda a longeva experiência humana, acabou reduzido a "textão", "palavreado", "lenga-lenga", "mimimi", "um monte de palavras amontoadas".

É a sagração da estupidez. A inépcia chegou ao topo e se instalou no Supremo Tribunal Federal. Lá, porém, recebeu o justo veredito em venerando acórdão relatado pelo ministro Luís Roberto Barroso: "perdeu, mané!"

(Luis Antônio Albiero de Capivari SP, em Jacareí, SP, aos 15 de setembro de 2023)

25/03/2023

Maldita Mídia Velha

“Eu me lembro com saudade o tempo que passou", cantava o jovem Roberto Carlos na virada dos anos sessenta para setenta do século passado, hoje expoente da boa e velha guarda da MPB, versos que o eterno rei completava com o refrão "velhos tempos, belos dias".

O adjetivo "velho" tem diversas acepções. Quando dizem de mim, por conta dos cabelos em neve e à porta da idade que me outorgará a condição oficial de idoso, em geral assim tachado por gente com bem menos tempo de juventude do que eu, costumo dizer que torço para que a natureza contemple meu interlocutor com a bênção da velhice, esta mesma com a qual ele crê me achincalhar, porque a única alternativa a ela será uma experiência sobre a qual ele não estará aqui para contar como terá sido.

Noutra acepção, como na bela canção do rei hoje octogenário, "velho" traz à mente algo bom, agradável, reconfortante, nostálgico. Essa concepção acaba me deixando incomodado sempre que leio ou ouço o tratamento que se dá ao jornalismo cativo como "velha mídia". Soa fofo e pode despertar uma nostalgia que não corresponde à realidade. Quem, como eu, acompanha desde tenra idade a mídia brasileira sabe como ela se comportou nesses anos todos. Ela, de fato, envelheceu, e envelheceu muito mal.

Não a trato, por isso, por "velha mídia". Basta uma singela mudança de posições e tenho o que considero uma construção melhor: "mídia velha". Os canalhas envelhecem e isso se deu também com o jornalismo comandado por meia dúzia de famílias que dirigem a Casa Grande.

Hoje, porém, vi-me obrigado a atribuir outro qualificativo: maldita.

Lula deu uma longa entrevista à TV Brasil 247, serena, responsável, proveitosa. Falou de sua saga no combate pela redução dos juros, de seu empenho em criar empregos, da promissora viagem à China, dos vários programas sociais que vem implementando e que pretende realizar - um manancial de informações a serem exploradas pelos espectadores e pelos demais veículos de comunicação do país.

De uma entrevista de quase duas horas, a mídia velha destacou menos de dez segundos em que, em dado momento, o presidente permitiu-se rememorar o que dizia a procuradores que o visitavam na carceragem de Curitiba, lá entre 2018 e 2019. Quando lhe perguntavam se tudo estava bem, ele respondia que "estará bem quando eu ‘f***r’ o Moro". Contou isso com serenidade, rindo, depois de um momento de emoção ao relembrar a dor que o ex-juiz lhe impingira ao submetê-lo a um processo de desmoralização e destruição de sua imagem.

Processo que, a reboque, levou-lhe a esposa, morta por conta da hipertensão causada pelas mentiras que contavam Moro e a mídia velha sobre o marido e filhos. Que lhe custou não poder ir ao velório do próprio irmão e ter de ficar tempo mínimo no do neto de sete anos de idade. Que também levou à morte da indústria naval, à destruição da construção civil, de milhões de empregos, da economia nacional e do estado democrático de direito. E que ainda retirou da corrida presidencial o candidato que liderava as intenções de voto porque encarnava a esperança do povo brasileiro pela volta das tantas alegrias dos velhos tempos, dos belos dias de crescimento econômico, inclusão e ascensão social.

Moro promoveu a maior fraude eleitoral da história e, literalmente, “f***u” Lula e o Brasil.

Com muita perseverança e invejável capacidade de resiliência, contando com uma defesa judicial aguerrida e competente promovida pelo próximo ministro do STF Cristiano Zanin e equipe, Lula deu o troco. Desmascarou o juiz parcial e odiento que extrapolou todos os limites éticos e jurídicos para “f***r” o petista. Enfim, Lula, sem ultrapassar os limites do devido processo legal, praticou a justa vingança só admitida pela sociedade moderna se e quando praticada pelo Estado, que detém o monopólio punitivo, com plena observância das leis e princípios jurídicos. Assim foi que ele se vingou. E, realmente, “f***u” Moro.

Na entrevista, portanto, Lula referiu-se a um desejo e a uma promessa já cumpridas e apenas contou o que era sabido por todos, ou ao menos intuído. Quem, que não tenha sangue de barata, não diria em privado que gostaria de “f***r” um seu algoz de tal magnitude em semelhante situação? Quem, senão alguém que fosse capaz de flutuar acima dos demais seres humanos?

Lula é humano, demasiadamente humano, e por mais que pregue a paz e não guarde ódio, nem alimente espírito de vingança, tem também seus momentos de desabafo em que se dá ao luxo de exteriorizar resíduos de ressentimentos ainda não completamente cicatrizados.

A mídia velha, no entanto, teve a audácia de abrir a Moro e seu dalanholzinho amestrado tempos jamais concedidos a Lula quando estes o “f**iam” dia sim, dia também. Não bastasse, essa mesma imprensa comprometida com o capital e isenta de qualquer compromisso com a verdade e com a vontade popular ainda se deu ao desplante de atribuir a Lula a condição de “desequilibrado”, com ameaças até de “impeachment”.

Ora, ausência de equilíbrio revelou o hoje senador paranaense já ao tempo em que essa característica lhe era exigida por lei, por dever de ofício. Um desequilibrado político, então maldisfarçado sob a toga, que condenou o então ex-presidente por um crime inexistente, inocorrido, improvado. Que fez malabarismo jurídico para o condenar por corrupção passiva porque uma empreiteira “atribuiu” a Lula um certo imóvel que este recusou. “Atribuir” não corresponde a nenhum dos três verbos que tipificam o crime em questão (art. 317 do Código Penal), que são “solicitar”, “receber” ou “aceitar” (a promessa de receber) vantagem indevida (propina; no caso, o tal apartamento tríplex no Guarujá). Lula não “solicitou”, não “recebeu”, nem “aceitou” promessa alguma, mas o canalha togado afirmou, na sentença, que o condenava porque a OAS havia “atribuído” o imóvel a ele.

Insuficiente o fundamento, ainda assinalou na mesma sentença que o condenava por “atos de ofício indeterminados”. Incapaz de apontar um ato de ofício ou uma omissão em relação a dever de ofício que Lula houvesse praticado ou deixado de praticar para favorecer a OAS de modo a justificar o apartamento “atribuído” a ele – uma exigência do tipo penal –, o canalha apelou para a indeterminação dos atos.

Ainda carente de sustentação sólida e vendo que não havia como caracterizar a posse do imóvel pelo ex-presidente, muito menos a propriedade do imóvel em favor de Lula, porque escritura não houve, porque registro imobiliário não houve, porque desfrute do imóvel não houve (nem por si, nem por outrem), o mesmo canalha recorreu à criatividade e inventou uma tal “propriedade de fato”, que não é propriedade, nem posse, nem coisa alguma.

Canalha, canalha, canalha! Três vezes canalha, como disse Tancredo Neves ao presidente da Câmara que cassou o mandato de João Goulart em 1964 por estar “ausente do país” num momento crítico, quando na verdade Jango se encontrava no interior do Rio Grande do Sul. Algo parecido com o que se tentou fazer em 8 de janeiro deste ano, sem sucesso, quando a Democracia brasileira foi salva graças à tecnologia do whattsapp e à argúcia do ministro Flávio Dino, experiência – a de 1964 – que pode voltar a se repetir durante a viagem de Lula à China. Mantenha-se alerta, ministro!

Mas três vezes canalha não é a medida exata de Sérgio Moro. A despeito de ter sua vida salva por uma pronta, eficiente e competente ação da Polícia Federal do governo republicano liderado por Lula, sob a batuta do ministro Dino, o ex-juiz suspeito e sempre canalha aproveitou-se da fala do presidente da República para atacar quem salvou a si e à sua família. Um ingrato, um desalmado, um injusto e, sobretudo, ele sim, um desequilibrado, porque foi à mídia velha dizer que ao mencionar que, no passado, Lula alimentava o desejo já realizado, o presidente estaria terceirizando aos seus seguidores a tarefa de promover algo grave contra o atual senador e familiares, associando a fala aos planos da quadrilha do PCC. Algo surreal e desconcatenado que não resiste a um raciocínio minimamente lógico e inteligente, mas faz todo o sentido para os que habitam a terra plana em constante estado de desequilíbrio emocional e cognitivo.

E com maior desequilíbrio agiu o ensandecido ex “preocupador da República”, aquele que seguiu o exemplo de seu “coach” de toga e também abandonou carreira jurídica sólida para aventurar-se no terreno movediço da Política, o ungido das faces róseas a quem foi concedido espaço e tempo igualmente longos na mídia velha para associar a fala de Lula à quadrilha desbaratada e presa pela Polícia comandada, em última instância, pelo atual presidente.

Um bando de canalhas desequilibrados que arruinaram a própria biografia e hoje estão desesperados por conta de sanções que vêm sofrendo por parte do CNJ e do TCU, por conta dos excessos cometidos. Dallagnol chegou ao cúmulo de caracterizar o CNJ, o TCU e o presidente da República como extensões do “crime organizado” associado ao PCC. Isso em meio ao prende-e-solta do doleiro Alberto Youssef e às vésperas do depoimento do advogado Tacla Duran ao juiz Eduardo Appio, na próxima segunda-feira, com potencial para promover estragos irreparáveis à desmoralizada OrCrim da Lava Jato. O medo, de fato, leva a atitudes descontroladas.

E a quem a mídia velha resolveu tachar de “desequilibrado”? Exatamente ao presidente Lula, sobretudo depois que este, em nova entrevista, esta concedida “no meio da rua”, abriu os olhos da Nação para a armação do circo e do palanque que Moro resolveu montar juntando a frase dita ao Brasil 247 ao plano da quadrilha do PCC desvendado pela Polícia Federal. Logo Lula, que em cada aparição pública faz questão de frisar, com evidente sinceridade, que não guarda ódio no coração, que não age por vingança. Exatamente ele que havia acabado de dar um “pito” na companheirada radical de Pernambuco que, num evento da presidência da República, vaiou e deu as costas à governadora Raquel Lira só por ela ser do PSDB, que lá estava a convite do presidente, gestos que o reafirmam como estadista detentor de absoluto equilíbrio.

Ao longo desses anos todos em que atacou desmedidamente Lula e o PT, a mídia velha deixou cravado na História do jornalismo brasileiro o quão desequilibrada é capaz de ser e, de fato, foi e continua sendo. Mídia velha, carcomida e maldita! “Apesar de você”, como segue cantando outro ícone da velha guarda da MPB, é pelas mãos do seu “desequilibrado” Lula que estão retornando todas as alegrias dos belos dias, dos bons e velhos tempos.

(Luís Antônio Albiero, em Capivari, SP, aos 25 de março de 2023)

21/12/2021

Lula e a Consciência do seu Tempo

A realidade exige pragmatismo.

Lula tem consciência do momento e do papel que lhe cabe.

Que bom seria se pudéssemos apresentar uma chapa pura - Lula e Gleisi, Lula e Haddad, Lula e Dilma! Ou pelo menos de esquerda, Lula e Dino, Lula e Manuela, Lula e Freixo, Lula e Boulos...

Não agregaria nada, não geraria simpatias, muito pelo contrário. Seria demonstração de sectarismo, de arrogância, do PT ou das esquerdas.

Os movimentos que Lula vem fazendo têm-lhe aberto portas, as mais inesperadas. Veja-se o destaque que, súbito, as organizações Globo e toda mídia velha vêm dando a Lula, desde o giro pela Europa até o jantar do Prerrogativas.

Lula sabe que, mais do que juntar letrinhas e nomes fortes para ganhar uma eleição, ele precisa exortar a paz, resgatar a união das famílias e o respeito entre adversários políticos.

Ele sabe que enterrar o bolsonarismo, abortar o fascismo já em fase avançada de desenvolvimento, é condição necessária para que ele próprio, ou qualquer outro que venha a vencer a eleição, tenha um mínimo de tranquilidade para governar, tenha segurança política e jurídica.

O ódio disseminado por todo o país desde que se exacerbou o antipetismo, que na verdade significa "antipovismo", ódio ao povo, às conquistas sociais dos debaixo, dos antes condenados à senzala, só vai se esvair com doses mais fortes de governo petista.

É preciso avançar em iniciativas que signifiquem empoderamento do povo pobre, como as políticas de cotas nas universidades, Prouni, Ciência Sem Fronteira, por exemplo.

Sobretudo agora, quando se tornou imprescindível recuperar direitos e políticas públicas exterminadas pelos governos Temer e BolsoNero, como os direitos trabalhistas, o sindicalismo, a proteção dos trabalhadores, a par da revisão de toda política entreguista dos últimos governos.

Para isso é necessário mais do que apenas retornar ao comando do governo, é ter garantias de governabilidade. Aprendamos com a História, particularmente com os fatos mais recentes, como o golpe dos corruptos de 16.

Teremos de ampliar nossa representação no Congresso. Resgatar os direitos trabalhistas exigirá aprovação de uma PEC, vale dizer, obter os votos de mais de trezentos deputados e senadores. Viabilizar políticas de inclusão social, idem, pois será preciso derrubar o teto de gastos e, para tanto, modificar a Constituição. Só para evitar um impeachment são necessários quase duzentos deputados aliados e leais.

O Brasil é muito grande, os interesses são os mais diversos, nossa cultura política, sobretudo no que diz respeito ao exercício da democracia, é ainda incipiente e frágil. A par disso, nosso desenho político-institucional é complexo e exige do presidente negociar constantemente com o parlamento.

Antes tenhamos que dialogar com o ex-PSDB de Alckmin e FHC, com o MDB de Renan Calheiros, com o PSD de Gilberto Kassab, respaldados por PT, PCdoB, PSOL, PSB, PDT, PV e Rede, do que termos de ceder à truculência do bolsonarismo. E, por óbvio, só poderemos dialogar com aqueles, e não com estes, se os primeiros forem eleitos - de preferência, sem a presença significativa dos últimos.

(Luís Antônio Albiero, em Jacareí, SP, aos 21 de dezembro de 2021)

20/10/2021

Valdemar e os Demais

BolsoNero, o sincerão, disse ontem que quem não estiver satisfeito com seu desempenho na presidência deve procurar alguém melhor do que ele na próxima eleição.

Lembrei-me do colega Norberto Raimundo de Góes, advogado de Capivari que foi presidente da subseção local da OAB e a quem sempre tive como referência de profissional competente e pessoa digna. Foi ele quem me contou a história que narro adiante.

Estavam no famoso Bar do Papai um outro colega advogado - também amigo meu, por sinal, razão por que deixo de identificá-lo - e um açougueiro de prenome Valdemar, ambos muito conhecidos nas terras de Tarsila. Por minutos que pareceram horas sem fim, o doutor da lei enumerou ao companheiro de copo dezenas de casos bem sucedidos de sua longeva carreira jurídica.

Eis que, a certa altura, o magarefe, vendo que o causídico não pararia de gargantear, interrompeu-o com a sem-cerimônia de quem tem habilidades no talhe das carnes e desferiu uma observação incisiva que lhe perfurou como faca afiada o ego avantajado:

- Doutor, cheguei a uma conclusão. O senhor é, de fato, o segundo melhor advogado de Capivari.

O comentário pegou o meu amigo e colega bacharel no contrapé e ele afogou-se com a bebida que ingeria. Depois de algumas tossidelas e breve arrumação, desengasgou-se e indagou, confrangido e despeitado:

- Mas, Valdemar, então me diga, quem é o melhor?

Com a calma de quem amola o instrumento que acabara de usar, o talhador engoliu a última dose de cachaça, deu a bafejada própria de quem sente queimar da goela ao estômago, limpou os lábios com o dorso da mão e tascou:

- Os demais!

O saudoso Norberto contou-me essa história, absolutamente verdadeira, em mais de uma ocasião e em todas elas terminou disparando uma sonora e deliciosa gargalhada.

Por onde andará o carneador Valdemar? Nesta hora, seria bastante oportuno que ele dissesse a Jair Messias BolsoNero quem, dentre os demais candidatos a presidente da República, de Daciolo a Lula, passando por Ciro, Marina, Doria, Eduardo Leite e todos os outros duzentos e treze milhões de nativos - aí inclusos eu e você que me lê -, é melhor do que ele para governar este país.

(LUÍS ANTÔNIO ALBIERO, em Jacareí, SP, aos 20 de outubro de 2021)

16/06/2018

Deus e o Diabo na Terra do Quá

 

Desacorçoado com todas as injustiças que Moro vinha praticando contra Lula, Deus resolveu que devia interceder.
O criador do céu e da terra levou em conta que Lula socorreu quase quarenta milhões de seus amados filhos que viviam abaixo da linha da miséria, antes condenados a morrer de fome ou à exclusão do meio social, e resolveu ir pessoalmente à vara de Curitiba. E o fez como mandam os protocolos humanos.
Com seu jeitão humilde e educado, chegou ao saguão do Fórum, apresentou-se ao oficial de justiça que atendia à porta do juiz, conversou com sua assessora pessoal e pediu uma audiência com o chefe da Lava Jato.
Maravilhada diante de tão ilustre personalidade, a loura simpática, atrapalhando-se com seus grandes óculos e a correntinha que os prendiam ao pescoço, disse a Deus, com muito jeito:
- Espere um instantinho, por gentileza, meu senhor. Vou estar vendo com o meritíssimo, volto já.
E Deus, em sua reconhecida bondade sem fim, sentou-se, perdoou-a em pensamento pelo gerundismo e aguardou.
Lá dentro, a assessora informou o chefe:
- Doutor, Deus está aí na antessala e aguarda sua autorização para uma audiência.
Moro, sem alterar o semblante, sem fazer um mínimo gesto que pudesse amarfanhar sua camisa preta, lançou para a moça um olhar frio e disse, com a estrídula voz que lhe rendeu a famosa alcunha:
- Hããã... Quem ele pensa que é?
E não o atendeu.
Interessante é que uns dias antes o próprio Lula já havia recebido, sem qualquer restrição das autoridades lavajatistas, outra ilustre visita. Do Capeta, também em pessoa.
O Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num instante todos os reinos do mundo.
Disse-lhe o Diabo:
- Dar-te-ei a liberdade. Se tu desistires de ser candidato a presidente, serás livre!
E lançou o Anjo das Trevas um tonitruante berro que ecoou pelo vale e se fez ouvir por todo o país:
- Lula livre!!!
O ex-presidente fitou-o com olhar matreiro, sorrisinho de lado, enquanto cofiava a barba branca, e perguntou ao Capiroto:
- Foi Gilmar Mendes que o mandou vir aqui, não foi?
O Coisa Ruim ferveu em ódio, avermelhou-se em brasa, mas não abriu o bico, cônscio de que a missão que cumpria era supremo segredo de justiça que não se vaza.
Lula, que vinha ocupando seu tempo na masmorra com leituras, recorreu a Vinícius de Morais. Lembrou-se de “Operário em Construção” e respondeu:
- Não!
O Tinhoso, revelando-se também iniciado em literatura, com gestos, trejeitos e eloquência de um ator em peça de Shakespeare recitou:
"- Dar-te-ei todo esse poder e a sua satisfação, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem bem quiser. Dou-te tempo de lazer, dou-te tempo de mulher. Portanto, tudo o que vês será teu se me adorares e ainda mais, se abandonares o que te faz dizer não."
Voltou-se para o presidente operário e aguardou-lhe a resposta a tão sedutora proposição.
Lula olhou com redobrada atenção para tudo que do alto do monte podia ver e, em cada coisa que via, misteriosamente havia a marca de sua mão.
O ex-presidente aquietou-se e, no longo silêncio, ouviu a voz de todos os seus irmãos, dos companheiros que morreram para que outros vivessem. Uma esperança sincera cresceu no seu coração e, na tarde mansa, agigantou-se a razão de um homem a quem quiseram pobre e esquecido. Razão, porém, que o fizera dum operário em construção um estadista construído.
E o operário disse:
- Não!!!
"E o operário fez-se forte na sua resolução.”
(LUÍS ANTÔNIO ALBIERO, em Crônicas & Agudas: https://www.facebook.com/147914562547688/posts/855821665090304/)
4.434
Pessoas alcançadas
1.261
Engajamentos
Pontuação de distribuição

19/12/2016

Sim, Roubou

Muitas pessoas me acusam de fanatismo porque ouso caminhar na contramão do fanatismo delas próprias.

Por exemplo, elas costumam dizer que têm certeza (convicção...) de que Lula roubou.

Nessas horas, eu costumo dizer a elas - cuidando para não as ofender - que o acusam certamente porque sabem de fatos criminosos e dispõem de provas, porque não posso partir do pressuposto de que ajam com leviandade.

Então, para que não sejam ou não se comportem como levianas, recomendo-lhes que sejam patriotas, que tomem uma atitude cívica, que comuniquem os fatos e encaminhem as provas ao MPF ou à Polícia Federal, que andam louquinhos para botar Lula atrás das grades.

Ultimamente, já de paciência perdida, tenho-lhes dito o seguinte, em "concordância" com o que dizem, como fiz há pouco:

"Sim, roubou. Só deve estar esperando passar desta para melhor para, no além-túmulo, usufruir de toda fortuna que roubou. Ou talvez aguardar uma nova encarnação e se lembrar de onde enterrou o tesouro."

(Luís Antônio Albiero, em Capivari, SP, aos 19 de dezembro de 2016)